terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O holocausto e a tragédia de Santa Maria



Tragédia inconsequente: jovens condenados a morte pela burocracia incompetente




Começar o ano com esta tragédia de Santa Maria não é, definitivamente, a melhor coisa do planeta.  Às vezes me assoma uma enorme sensação de insegurança e imprevidência. Aquele assassino que soltou o foguete de sinalização dentro da sala, em meio a um êxtase funk gaudério, seguramente não sabia que naquele momento iria condenar mais de 230 jovens à morte. E certamente não foi a primeira vez que ele fez isso. Não contava com a espuma de poliuretano usada para o isolamento acústico.

O poliuretano queima como pólvora e exala um gás venenoso que mata em minutos. Some-se a isso, a falta de sinalização da boate, as rotas de fuga (só havia uma) obstruídas, a super-lotação. Tá feita a cagada.

Fiquei impressionado com as declarações do Corpo de Bombeiros, da Brigada Militar e da Prefeitura de Santa Maria. Todos disseram que o estabelecimento estava regular. Muito embora o alvará estivesse vencido e uma olhada básica e neófita seria mais que suficiente para condenar o local. E o prefeito, César Schirmer, que não deu as caras em nenhum momento. Sequer foi visto. E ainda teve a desfaçatez de dizer que a culpa foi do foguete sinalizador. Não diga!

É bem verdade que nada vai trazer os jovens de volta. Mas, o prefeito, a banda, os donos da boate, o comandante da Brigada e do Corpo de Bombeiros deveriam na melhor das hipóteses ser confinados em uma cela por um tempo nunca inferior a sete mil anos, que é o resultado da multiplicação da pena máxima por homicídio vezes o número de vítimas.

Sempre tive certo desconforto com aglomerações, populações desenfreadas, estas coisas. Não gosto nem de sentar na janela de um avião. Quando entro em um ambiente fechado com muita gente, tipo um cinema, logo procuro saber onde estão as saídas de emergência, estas coisas básicas de sobrevivência.

O mundo realmente enlouqueceu!

Domingo foi o dia Mundial de Lembrança do Holocausto. Não faz tanto tempo assim. Seis milhões de judeus, homens, mulheres e crianças, ricos e pobres, jovens e velhos, foram exterminados pela insanidade nazista. Foi outro dia. Tudo começou na Noite dos Cristais em 1938. Acompanhei o prefeito a uma cerimônia da Comunidade Israelita. Como sempre ele brilhou ao citar Theodore Adorno, o grande pensador contemporâneo alemão. Algo mais ou menos assim:  Depois do holocausto, a humanidade perdeu o tempo da utopia.

Estávamos todos traumatizados com as informações de Santa Maria. Episódios dramáticos como este convocam a responsabilidade dos administradores públicos. Nos obriga a refletir sobre o papel que desempenhamos. Muitas vezes um carimbo e uma assinatura indevidas, aparentemente burocráticas, podem na essência representar a morte de centenas de pessoas.

Quem permitiu o funcionamento de uma ratoeira do porte daquela boate Kiss e se omitiu no seu papel de fiscalizar as condições, fez como aquele oficial nazista que carimbou um papel e deu passagem a um trem carregado de judeus com destino a Auschwitz. Indiretamente condenou todos à morte.