domingo, 15 de dezembro de 2013

Liberdade ou libertação?




Nina, 15, graduada: dilema de uma geração em busca de afirmação






Taí uma discussão que não tem fim: qual é o limite da liberdade e do libertário¿

Fui criado e desenvolvi um conceito primário de que os limites da liberdade estão nela mesma. Ou seja, a liberdade de um cidadão acaba onde começa a de outro. Ou ainda um conceito mais rudimentar de que a liberdade coletiva tem preponderância sobre aquela individual.

E o libertário¿ Como se ensina alguém a ser livre¿

Esta reflexão me assomou diante da cerimônia de formatura da minha filha mais nova, a Nina, que sabe Deus como, atingiu a graduação no ensino fundamental e ainda de quebra me descadeirou com um impressionante trabalho sobre O Alienista, de Machado de Assis. Foi o melhor presente de Natal que ela poderia ter me dado.

Minha filha é uma guerreira. Este ano ela enfrentou a mudança para São Paulo e recebeu um impacto tremendo com as manifestações de junho, que como um tsunami na mente das pessoas, sobretudo nos adolescentes, arrasou o bom senso e impôs a idéia estapafúrdia de que a democracia se faz pela via direta, nas ruas, e que nós dirigentes públicos, com mandato ou sem, somos seres desprovidos de qualquer compromisso social.

Muita gente boa, não só a minha filha, começaram a dar tratos a esta bobagem. Um amigo querido a quem respeito profundamente, chegou a me chamar a atenção para o fato de que as ruas estavam por indicar um novo caminho e que a juventude estava se manifestando. Bull shit!

Sem liderança, o caminho a ser trilhado é o da barbárie e da confusão, que só interessa as classes dominantes. Quem ensina isso é ninguém menos que Vladimir Ilitch Ulianov, o Lenin.

Tá legal. Graduação de ensino fundamental é muito mais uma babação de pais e avós do que qualquer outra coisa. Mas, se vamos fazê-la, é justo que a façamos direito. Não tive o privilégio da minha filha. Não me graduei no fundamental numa escola libertária. Lembro-me que ajudei na celebração da missa e depois todos nós vestidos com o uniforme habitual que nos havia acompanhado e torturado durante os longos quatro anos do ginásio, participamos da cerimônia de “colação de grau”, diante de nossos pais.

Foi a única que o velho Nunzio participou e me lembro vivamente que ele não cabia de tanto orgulho. O paraninfo da minha turma foi o professor Max, de Ciências. Um alemão que não falava português e ensinava em inglês. Como ele se entendeu com o papai que só falava italiano e se fazia entender como o Juó Bananieri, é um mistério.

Tá bom. Foi há muito tempo. Mais de meio século. Éramos pobres.

Mas, alguma coisa se perdeu não só na relação dos estudantes e de suas famílias com a escola. Como da própria escola em relação a sociedade e ao conhecimento. Se educar é formar cidadãos, há que se mostrar o norte e a responsabilidade do futuro. Rebeldia é saudável. Romper os paradigmas (desculpem pela expressão) da sociedade, também. Por outro lado, é bom saber por que, para quem e a quem interessa fazer isso. Caso contrário, a sociedade vai se conformar em 140 caracteres e um bando de gente defendendo uma utopia indefinida.

A família, a escola, e até a Igreja, porque não, cumprem o papel de organizar esta barafunda. 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

La Boheme, a ópera adotada por São Paulo





La Boheme/2013: o Municipal trilha sua vocação de ser uma casa de ópera



Dificil resistir a La Boheme, ainda mais esta que está em cartaz no Theatro Municipal de São Paulo, tratada com zelo pelo maestro John Neschling e por toda a equipe da Fundação, com o competente José Herência à frente.

Vale dizer que La Boheme é a ópera de São Paulo. Razões efetivas, desconheço. Com efeito, a obra-prima de Puccini estreou em Turim, em 1896, e um ano depois era montada no antigo Teatro São José, onde hoje é o Shopping Light, com amplo sucesso de público e crítica. Embora o Municipal tenha sido inaugurado com Hamlet, de Ambroise Thomas, em 1911, no mesmo ano a cidade viu os personagens criados por Luigi Illica e Giacomo Giocosa desfilarem pelo palco da cidade.

Eu mesmo vi mais de uma dúzia de montagens. Já vi cenas de La Boheme acompanhadas apenas por piano, até em garagens. Lembro-me de uma com o maestro italiano Gigi Campanino, que trocava de camisetas coloridas a cada ato, durante o ensaio geral.

Vi La Boheme em Roma, na Royal Opera House do Convent Garden, no Colon, de Buenos Aires. Tenho uma meia dúzia de gravações. A que mais me agrada é uma jóia rara, regida por sir Thomas Beecham, com Jussi Bjoerling e Victoria de Los Angeles.

Esta Boheme/2013, em São Paulo, está sem dúvida entre as melhores que eu vi e ouvi. A começar pela concepção cênica, moderna, asfixiante como deve ser uma mansarda em Paris, larga como deve ser a festa de Natal no Quartier Latin, intimista como deve ser a cena dos limites da cidade.  O trabalho de Arnaud Bernard é irrepreensível.

A obra de Puccini é aparentemente singela sob o ponto de vista musical. Mas, trata-se de um solene engano. Não é. Ela exige muito da orquestra e do regente. Neschling foi perfeito. Soube conter a torrente melódica ao mesmo tempo em que ressaltava a voz e as nuances líricas dos cantores. Por outro lado, foi cirúrgico ao administrar a armadilha do final do segundo ato, quando a fanfarra entra em cena em um compasso distinto da orquestra e dos cantores.

Por falar em cantores, pela menos na versão que eu vi, que seleção maravilhosa. A meio grega Alexia Voulgaridou, detentora de uma voz quente e expressiva fez uma Mimi mágica, frágil e delicada como convém. A soprano romena Mihaela Marcu, no papel de Museta, seduziu a todos com uma cavatina imperiosa no segundo ato. Cheia de frescor e de humor. No terceiro ato foi assombrosa, perfeita no quarteto. O tenor brasileiro Atalla Ayan (Rodolpho) não possui uma voz tonitroante. Ao contrário é como um cristal, límpida, clara, com curvas perfeitas. Por outro lado, o barítono italiano Simone Piazzola (Marcelo) é vigoroso e potente. Felipe Bou (Colline) e Mattia Olivieri (Schaunard) perfeitos. O Coral Lírico, agora sob o comando de Bruno Greco Facio, está mais solto, mais alegre. Enfim, o Municipal está mesmo no caminho de se tornar uma verdadeira casa de ópera.

Esta La Boheme estará em cartaz no Municipal até o dia 29 de dezembro, sempre as terças, quintas, sábados e domingos. Evidentemente não haverá espetáculo dia 24.