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Com vagas garantidas: e se os estudantes pobres começarem a formular? |
Uma das mais estranhas
sensações que eu senti nos 10 anos em que trabalhei no governo federal deu-se
por conta da sanção presidencial ao projeto que garantia as cotas nas
universidades e institutos federais. A proposta de iniciativa legislativa
tramitou por mais de 14 anos no
Congresso Nacional e por estes meandros místicos , que ninguém explica,
subiu para o Planalto com uma redação sensata e objetiva. Ou seja, em cinco
anos, 50% de todas as vagas públicas federais universitárias deverão ser
preenchidas por estudantes oriundos da rede pública, preservadas as
características raciais em todas as vagas e os níveis de baixa renda familiar,
para as quais se reserva um quarto.
O impacto nas
universidades foi tremendo. Chegou ao ponto de um reitor de universidade do Rio
de Janeiro propor a desobediência civil. Até a agência de propaganda que atende
ao MEC chegou a me aconselhar que o governo não deveria abrigar semelhante
iniciativa, por considera-la impopular. No momento da sanção, recebi ordens de
importante assessor palaciano para que não se desse publicidade ao fato: “Vamos
provocar a classe média e gerar inconformidade nestes setores” - me dizia.
Com efeito, a sanção se
deu de forma burocrática, sem maiores alardes. A regulamentação, entretanto,
teve o dedo decisivo da presidente Dilma: “Quero isso aplicado ainda este ano”.
Não se negue o chamado poder
de confronto da classe média brasileira. Mas, se uma coisa nós devíamos ter
aprendido nestes anos todos de Lula e agora de Dilma é que eles não gostavam,
não gostam e jamais gostaram de um governo popular democrático. Nunca nos deram
e jamais nos darão uma procuração. Esta história de se misturar com o povo é
muito legal no Carnaval, mas acaba na quarta-feira de Cinzas.
Educação pública de qualidade é um imperativo,
sobretudo para formar mão de obra qualificada , que vai ajudar na acumulação de
capital das empresas nacionais. Mas, para por ai. Que história é essa do filho
ou filha da empregada ou do motorista ter vaga garantida na universidade! E se esses meninos e meninas
chegarem à conclusão de que o glamour da modernidade, dos discursos vazios e
politicamente corretos, só servem mesmo
para obstruir a visão do que realmente está por trás de tudo: a luta de
classes.
Hummm! Realmente é
preocupante. Já imaginou se estes meninos e meninas deixarem de sonhar com a
glória nos gramados de futebol, com uma aparição no BBB ou na revista Caras, e
passarem a formular uma sociedade diferente que transforme a realidade deles e
de seus pais e vizinhos.
Muita gente ficou
desconfortável com o Prouni, o programa que concede bolsas – mais de um milhão –
para alunos de baixa renda em instituições privadas de ensino superior. Também não gostaram da expansão das
universidades e dos institutos federais e da multiplicação dos câmpus em todo o
país. Não gostaram do ENEM e decididamente ficaram contrariados quando viram
que o Plano de Desenvolvimento da Educação, o PDE não era apenas retórica ou um
destes planos estatisticamente insignificantes que massageava levemente a
consciência de uma classe abastada.
Há luz no fim do túnel. É
tudo uma questão de ir ao encontro dela. O jornalão dos Mesquita, o vetusto O
Estado de S.Paulo publica em sua edição de hoje, domingo, dia 17, pesquisa
realizada pelo IBOPE que comprova que 62% da população apoia a adoção de cotas
pelas universidades públicas para negros, pobres e alunos de escolas públicas.
Nada menos que 77% apoiam as cotas para estudantes de baixa renda. E, 32% são
contra as cotas raciais. Apenas 16% são contra qualquer tipo de privilégio. Segundo
a pesquisa, em nenhum estrato social a oposição ás cotas nas universidades
públicas é maior que o apoio a elas.
Vou terminar com uma frase
de frei David dos Santos, diretor da Educafro: “Quando a sociedade passou a ter
informações qualificadas, equilibradas, sem a emoção de militantes a favor ou
contra, o povo passou a entender a verdade da causa”.
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