Montagem do Teatro Helikon de Moscou: sucesso na Europa e em São Paulo |
Em 1934, quando estreou no
Teatro Mikhaylovsky, na então Leningrado, a montagem de Lady MacBeth do
Distrito de Mtzensk, muito pouca gente conhecia a pequena novela de Nicolai
Leskov, publicada em 1865, e que serviu de base para o libreto da ópera de
Dimitri Shostakovitch.
Leskov, inspirado certamente
por Flaubert, conta a história de Katerina, uma dona de casa provinciana que se
entrega para um amante e inicia uma série de assassinatos. Adultério, sexo,
estupros, coisas raras de se ver de forma tão explícita num palco de ópera.
Ainda mais porque, como no caso da anti-heroína de Shakespeare, a história pode
se passar nas Ilhas Britânicas da Idade Média, na Rússia tzarista do século
XIX, no regime soviético, ou em qualquer ponto do planeta nos dias de hoje.
Afinal, trata-se aqui de discutir o papel de submissão a que as mulheres são e continuam
a ser condenadas.
A versão de Shostakovitch
fez muito sucesso não só em Leningrado, como de resto em diversas cidades europeias,
até que em 1936 uma badalada estréia levou Josef Stalin, apreciador de óperas e
concertos, ao teatro Bolshoi, em Moscou.
Stalin não gostou.
Acostumado aos acordes redondos de Rimsky Korsakoff e Modest Moussorgsky (sua
ópera predileta era a genialíssima Boris Goudonov) estranhou as dissonâncias e
as melodias interrompidas de Shostakovitch. Também não gostou da história,
considerada pequeno-burguesa pouco condizente com o regime soviético.
Dizem que ele mesmo escreveu
o editorial do Pravda, publicado no dia seguinte, 28 de janeiro de 1936. E a
crítica foi tão feroz que assustou não só o compositor, como todo um grupo de
intelectuais. Prokofiev se mandou para os Estados Unidos, Eisenstein caiu no
limbo, entre outros poetas e escritores que procuraram o exílio ou o anonimato.
Stalin percebeu que errou na
mão. Até porque Shostakovitch já era consagrado no mundo inteiro e a sua
Macbeth havia feito sucesso na Europa antes da estréia em Moscou. Nomeou-o
compositor oficial do partido, talvez a única coisa que Dimitri realmente não queria e encomendou uma grande sinfonia.
Foi assim que veio ao mundo
a monumental quinta sinfonia.
As relações entre Stalin e
Shostakovitch foram tensas até que o grande líder soviético foi para o
politburo do além em 1952.
Pessoalmente tenho adoração
pela música de Shostakovitch, além de suas sinfonias, em que destaco a
primeira, a quinta, a sétima, a nona e a décima, recomendo sua série de
quartetos e os dois concertos para piano, um deles também com solos e trompete.