sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O fantasma da praça Arthur de Azevedo



D.Giovanni, cena final: o fantasma atacou a mesa de iluminação no primeiro ato


(saiu no Brasil 247)
Um novo e surpreendente personagem apareceu pelos corredores do Theatro Municipal de São Paulo: o fantasma da ópera. Ao contrário do clássico mascarado que vive nos porões do famoso prédio de Paris, este tem motivações mais torpes. Pode ser uma viúva de gestões passadas, ou de produtoras passadas, de tempos não tão gloriosos, mas seguramente obscuros.

O fato é que na segunda récita de Aída, no mês de agosto, duas horas antes do pano subir, numa tarde fria de domingo, a direção do teatro constatou que os cabos de um dos elevadores de cena estavam rompidos.  Foi uma confusão danada, mas a equipe de diretores e registas do teatro conseguiu improvisar a montagem de forma a levar o drama da escrava etíope apaixonada pelo general egípcio sem que a plateia percebesse o ocorrido.

A direção do Theatro, entretanto, chamou a polícia. Registrou a ocorrência e solicitou providências à Prefeitura no sentido de policiar as coxias e os bastidores do palco.

Coerente com os novos tempos, o fantasma da ópera de São Paulo se comunica pela internet. Um perfil fack do facebook, pela manhã , anunciava que naquela tarde, os produtores de Aída “iriam se afogar nas areias do deserto”. Foi por pouco mesmo.

Domingo passado, dia 15, na terceira récita do D.Giovanni, de Mozart, e na terça 17, na metade do primeiro ato, caiu a fonte de energia da mesa de iluminação. O espetáculo foi interrompido por 15 minutos. A danação do mais ilustre conquistador de Sevilha consumou-se com atraso, mas com brilho.

Curiosamente, três minutos depois do ocorrido, o fantasma informava o ocorrido, muito antes da constatação dos próprios técnicos.

Há algo de muito podre nas coxias do Municipal. A dupla John Neschling e José Luís Herência enfrenta uma reação pequena, mas desesperada, de gente inconformada com o padrão de qualidade e excelência exigidos pela nova gestão. Pior, estão fazendo renascer o mais xenófobo dos sentimentos, aquele de reação aos músicos estrangeiros. Como se a qualidade artística tivesse pátria ou se qualificasse pelo local de nascimento. Uma bobagem monumental.

Se já tinha dado polícia desde a montagem de Aída, a história agora se complicou. O tal perfil fack está sendo monitorado pela polícia especializada em crimes digitais. Uma análise primária permitiu aos delegados perceber que além de mau gosto, os autores avançaram pelo perigoso terreno da calúnia e da difamação. E isso dá cadeia!

Depois do ocorrido em D.Giovanni, a Secretaria da Cultura solicitou a Controladoria Geral do Município a instauração de uma sindicância para apurar o eventual envolvimento de funcionários do teatro. O controlador Mário Vinicius Spinelli, trazido da CGU de Brasília, pretende durante a investigação analisar meticulosamente os contratos com as produtoras de tempos passados.  E o eventual envolvimento do fantasma com estas empresas, que aliás, por longos oito anos fizeram o que quiseram no teatro e na programação musical da cidade.

O cenário agora é outro. Naschling pretende fazer um concurso para completar as estantes vazias na orquestra do teatro até o final do ano. Pretende juntar os corais Lírico e Paulistano. Quer transformar o Municipal em um teatro de ópera, com pelo menos 10 montagens por ano, uma em cada mês. Não há lugar para amadorismo, para deuses cangaceiros.


Depois da montagem de Aída, o Municipal abriga agora o D.Giovanni, com o mesmo sucesso. A temporada segue com Jupyra e Cavalleria Rusticana, Ouro do Reno (em forma de concerto) e, finalmente, La Boheme. Cantores de talento, músicos esforçados e técnicos aplicados. O fantasma, por sua vez, vai se encontrar com a polícia e com os auditores da Prefeitura.