quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Voces não aprendem mesmo....


Brendan Gleese, como Churchill: sua versão é bastante idealizada e atraente




Há uns anos atrás, eu ainda estava em Brasília, quando perguntado sobre quem considerava fosse o maior estadista do século XX, não hesitei um minuto: Winston Spencer Churchill.

Quase fui massacrado. Churchill um conservador. Um defensor do estado mínimo. Um sujeito intolerante e intolerável. Estava perdido na história da II Guerra Mundial.

Nada, entretanto, abalava a minha convicção. Tinha lido um pequeno livro que eu comprei num sebo com todos os discursos dele no período da guerra, lido um par de livros que ele mesmo escreveu, incluindo sua auto-biografia. Ninguém que se expressasse daquele jeito ou escrevesse daquela maneira poderia ser menos que um gênio total. Inigualável.

Mas, os cães passam e a caravana ladra, ou seria o contrário¿ A Inglaterra por alguma razão, melhor, a história da Inglaterra virou a cereja do bolo. Tudo começou com dois baita filmes: A Rainha, onde Helen Mirren, sempre ela, maravilhosa e perfeita, faz uma Elizabeth II espetacular. E o Discurso do Rei, em que Colin Fith faz um Jorge VI (pai de Elizabeth e Margareth) espetacular – isso sem falar em Geoffrey Rush, que faz o terapeuta australiano que tratou da gagueira real.

Ai, de repente, nada menos do que cinco filmes sobre sir Winston. A saber:
·       
The Gathering Storm – com Albert Finney
·        Into The Storm – com Brendan Gleese
·        Chuchill’s Secret --  com Michel Gambon
·        Churchilll – com Brian Cox
·        Darkest Hour – com Gary Oldman

Ainda teve John Littgow na primeira temporada da série The Crown. Aliás, quem viu a série deve se lembrar, o episódio do Fog foi espetacular.

Todos os cinco, ou seis atores, foram muito bem ao incorporar o bull-dog inglês. O de Albert Finney parece profético. O de Brendan Gleese é o mais idealizado. O de Michel Gambon o mais fragilizado. O de Brian Cox, o mais inseguro e assustado e o de Gary Oldman o mais seguro. A cena de sir Winston (verdadeira não foi inventada) no metro de Westminster a fazer consultas aos populares, sobre o que eles achavam de propor um acordo de paz para a Alemanha, é espetacular.

Acho que o roteirista de Churchill exagerou um pouco e fez um primeiro ministro excessivamente assustado com a Overlord. Nem Eisenhower estava tão seguro da invasão da Normandia. E de Gaulle foi totalmente contra.

O Churchill de Michel Gambon conta o episódio do AVC, que ele escondeu da rainha e da opinião pública. E o de Brendan Gleese é bastante idealizado e mostra um Churchill inseguro com o resultado das urnas que, afinal, iriam derrota-lo. Albert Finney mostra um político seguro do futuro que se desenhava na Alemanha de Hitler.

Para entender sir Winston é fundamental estudar um pouco o final da era vitoriana. Aliás, recomendo também as duas temporadas de Vitória-A vida de uma rainha, disponível no Now.


Faz falta no mundo um estadista como sir Winston Spencer Churchill. Em qualquer de suas facetas, com todos os estereótipos e geniosidade. Vou concluir com uma de minhas frases prediletas. Pressionado pelos conservadores, que preferiam um acordo de paz com a Alemanha de Hitler, ele saiu-se com essa: “Vocês não aprendem mesmo. Quantas vezes terei de dizer que não se deve dar abrigo a ditadores, por mais poderosos que sejam e por mais que nos ameacem¿”

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

De joelhos, na Sé Lusitana


A Catedral da Sé na Alfama, em Lisboa: aqui começou a tragédia de 1755





Me correu mesmo um frio na espinha. Pois estava eu a conversar com o Todo Poderoso, de joelhos na Igreja da Sé, em Lisboa, quando me dei conta das sombras daquele templo do século XII. Foi ali que meia Lisboa estava reunida para celebrar a grande missa do Dia de Todos os Santos, as nove horas de 1º de novembro de 1755, na colina da Alfama, quando a natureza decidiu cobrar aos portugueses, sei lá, talvez a malvadeza da indústria da escravidão, que, apesar da tragédia, não cessou.

Há quem diga que o conde de Oeiras, promovido a marques de Pombal; Sebastião José de Carvalho e Melo, um burocrata medíocre que se transformou em genial, imaginava coroar sua epopeia de recuperação da então capital do império, com um golpe mortal nessa indústria tenebrosa. Mas, não há em toda obra pombalina qualquer gesto nesta direção. Ainda que dele tenha nascido o espírito libertário que animou os espíritos de Cláudio e Thomas, eles também omissos em relação a esta questão.

Ontem, passei pela Igreja da Estrela, onde está enterrada D.Maria I, rainha insana, que destruiu o pombalismo e foi mais do que cruel com os libertários das Gerais.

Portugal, este jardim plantado à beira do Atlântico, de onde as armas e os barões assinalados, vocês sabem, tem uma história de vilão a resgatar. Colonizador implacável, sugou enquanto pode as riquezas de suas colônias e não deixou nenhuma melhoria, que justificasse qualquer saudade. Premiou-nos com a mais dura Inquisição, com a escravidão de negros e índios, com a arrogância da fé cristã (como se fosse compatível).

Sebastião José de Carvalho e Melo talvez tenha sido o maior estadista português de todos os tempos. E ele viveu no século XVIII. É dele a brilhante resposta ao covarde D.José I, escondido em Belém embaixo da cama real, a tremer diante dos terremotos, dos incêndios e das inundações que se seguiram. O que fazer¿ Primeiro enterrar os mortos. Depois, alimentar os vivos.


Mas, estou aqui, de joelhos diante do Criador, na Sé Lusitana, ao lado do Tejo, o rio-mar, e pelo portal secular vejo o frisson turístico do que é hoje uma das mais atraentes cidades europeias. Sim, porque afinal, os portugueses aprenderam a receber. E estão se mostrando experts nisso. Que bom! Esta nova geração de patrícios talvez desconheça o que seus antepassados fizeram. 

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Revellion na Alfama


Katia Guerreiro: personalidade própria para cantar o fado 





Viver a virada do ano na Alfama, no templo sagrado do fado, em Lisboa, foi uma destas experiências únicas, que eu confesso jamais ter vivido, embora tenha sido, no passado, um habitue do Beco do Espírito Santo. Pois, me caiu no colo, graças a meus amigos Juliana e José Luiz, a passagem para 2018 na Mesa dos Frades, cujas guloseimas não encantaram tanto o paladar, quanto os sons excitaram minha audição.

Não é que me aparece uma rapariga, lá com seus 40 anos, nascida de pais portugueses na África do Sul. Médica formada e especialista em olhos, com uma voz de meio-soprano rouca e potente. Não. Ela não tem nada de Amália ou de qualquer outra cantante. Ela tem luz própria e personalidade própria. Canta e encanta com o coração. Quem quiser pode pesquisar no Google, a gaja se chama Katia Guerreiro e é um potentado.

Mas, seria injusto da minha parte não falar dos meninos que a acompanham, Pedro de Castro e João Felipe. Ambos se saem muito bem com suas guitarras e seus violões. São músicos sérios e profissionais, que navegam com o dedilhado no meio das cordas e reproduzem a linguagem do pentagrama.


Que pena que a noite acabou. Ficamos eu e Rejane completamente perplexos com o espetáculo singelo e intimista que estas moças e rapazes nos brindaram. Em maio, estarão todos presentes para uma apresentação em São Paulo. Será ótimo revê-los.