sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Há 50 anos, o mundo esteve por um fio


Kennedy e Kruschov: contiveram militares de seus paises queriam outra guerra






Este mês de outubro serve para comemorar 50 anos de uma efeméride cuja dimensão as novas gerações não alcançam. Foram 13 dias em outubro de 1962 em que a sobrevivência do gênero humano sobre este planeta esteve por um fio. O que me inquieta é que toda vez que eu conto esta história, meus filhos me olham com aquele ar de superioridade e aquela sentença terrível: “Papai, você é um exagerado. Imagina o mundo acabar. Isso não existe, nem nunca existiu”.

Para os jovens que nasceram na década de 80 e subsequentes, a guerra fria é algo tão distante quanto a Guerra da Criméia ou a invasão de Portugal pelo general Junot. Todos se riem muito do filme dr.Fantástico de Stanley Kubrick, mas acham que se trata de uma comédia ficcional, sem qualquer relação com a realidade.

Pois acreditem. Foi por um fio. Na noite do dia 25 de outubro, Ken O’Donnel, o chefe de gabinete do presidente John F. Kennedy, abraçou sua esposa e bastante tenso proferiu a seguinte frase: “Se o sol aparecer amanhã, será unicamente por conta da boa-vontade dos homens”.

Apesar de ser irlandês. O’Donnel não exagerou. Na noite anterior, ele acompanhara o irmão do presidente, Bob, em uma audiência com o embaixador Dobronyn, que representava a União Soviética em Washington. Ambos entabularam uma jogada de altíssimo risco, que envolvia a retirada de mísseis estratégicos de Cuba e da Turquia e sustaram o ímpeto dos militares dos dois países que queriam acionar seus arsenais nucleares.

O'Donnel e Bob: protagonistas da crise
Tudo começou de forma singela. Um U-2, jato de reconhecimento da Marinha americana ao realizar um sobrevôo habitual sobre a ilha de Cuba, em um domingo, documentou fotograficamente a implantação de mísseis atômicos de médio alcance, capazes de em cinco minutos destruir todas as cidades da Costa Leste dos Estados Unidos, incluindo a capital. A informação açulou o ânimo guerreiro do Pentágono, sobretudo dos generais Maxwell Taylor – chefe do Estado Maior – e Curtis Lemay, comandante dos bombardeios táticos.

Os militares americanos acharam enfim o argumento que precisavam para justificar uma invasão a Cuba. Estavam em baixa por conta do fiasco da Baía dos Porcos, quando uma força paramilitar cubana, equipada pela CIA, tentou uma incursão militar contra Fidel Castro e quebrou a cara. Passaram a pressionar Kennedy para ter uma nova chance.

O presidente americano montou uma linha defensiva com o Secretário de Estado, Robert Mac Namara, seu irmão Bob, Adlai Stevenson  e Ken O’Donnel. Kennedy havia acabado de ler um livro intitulado Guns in August, de Barbara Tuchmann, que naquele ano arrebataria o Prêmio Pulitzer. Nele, a autora contava com detalhes como a arrogância dos militares franceses e alemães levou a conflagração da Primeira Guerra Mundial, de tal forma que quando o imperador Guilherme II quis suspender a invasão da Bélgica, já não conseguiu. Foram 13 milhões de mortos em quatro anos de um conflito que ninguém entende por que começou, mas cuja principal conseqüência foi a segunda guerra, com mais de 53 milhões de mortos.

Super espiao: Alexander Fomin
Kennedy estava, portanto, bem vacinado. O’Donnel que era um frasista de mão cheia, ao ver as fotos dos mísseis soviéticos, exclamou: “Interceptamos os porta-aviões japoneses a caminho de Pearl Harbour!”

Se, por um lado, há ampla documentação e até as gravações das reuniões de Kennedy com os militares americanos, do outro lado, ninguém sabe direito o que aconteceu no Kremlim. Uma das primeiras reações do presidente americano foi a de perplexidade: “Levando-se em conta que Kruschov não enlouqueceu e que, portanto, não quer levar o mundo a sua destruição, gostaria que alguém me explicasse o que isso tudo quer dizer”.

O super agente da KGB em Washington, Alexander Fomin (Feklisov), que desempenhou papel importante na crise, revelaria mais tarde que Kruschov teria sido vítima de um grupo de oficiais destemperados do Exército Vermelho. É bem provável. Mas, nunca saberemos ao certo o que ocorreu.

Fidel Castro: único protagonista vivo
Quando Fomin informou ao amigo Kruschov que Kennedy estava disposto a assumir publicamente o compromisso de que não invadiria nem daria guarida a quem quisesse invadir Cuba, desde que a URSS tirasse os mísseis de lá, o premiere russo escreveu a resposta de próprio punho. Mais tarde, a resposta formal do Kremlim, contraditou o mandatário soviético. Tal procedimento levou a CIA a concluir que os militares soviéticos haviam tomado o poder.

Para quem não sabe, data de outubro de 1962 este estúpido bloqueio econômico que até hoje atormenta a República de Cuba. A União Soviética não existe mais. A Guerra Fria também não. Todos os personagens envolvidos, exceto Castro, já morreram. Mas, esta maldade com o povo soberano daquela pequena ilha do Caribe ainda continua.

Há quem diga que Kennedy levou um balaço na cabeça de Lee Oswald em Dallas como retaliação da comunidade cubana nos Estados Unidos. Há mesmo quem diga que os militares não se conformaram com a enquadrada que levaram do então primeiro mandatário americano, que salvou o mundo da destruição nuclear. Meu mestre, o jornalista Elio Gaspari, apaixonado como eu por este período histórico, não acredita. Ele acha que Oswald agiu por conta própria. É um tema apaixonante.

Kennedy quando enfim resolveu a questão dos mísseis disse para Bob e Ken: “Agora já posso ir ao teatro”. Referia-se ao Teatro Ford, onde Lincoln foi assassinado por John Wilkes Booth ao final da Guerra de Secessão. Mas, só encontraria seu algoz em 22 de novembro de 1963, um ano e um mês depois.   

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