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A Fontana de Trevi ao meio dia: descrição imponente de Respighi |
Meu querido avô postiço,
mestre e arquiteto da minha personalidade, teria coçado os bigodes fartos e
dito: “Mas seria preciso¿ Respighi não teria bastado¿”.
Tenho que admitir, o
impacto do concerto de abertura da temporada 2014 da Orquestra Sinfônica Municipal, ontem, foi
muito grande. Perturbador mesmo. Repassei cada compasso da tríade romana de
Respighi e poucas vezes na minha modesta vida de apreciador de música,
contemplei uma apresentação tão perfeita.
Que orgulho!
Um ano depois de catar os
cacos do mais tradicional conjunto sinfônico da cidade, o maestro John
Neschling derrubou o mito de que uma orquestra precisa de décadas para se
afirmar, mas confirmou outro: liderança é tudo, como diria o grande regente
Herman Scherchen, mestre de toda uma geração do passado.
Dos três poemas sinfônicos
que Respighi escreveu para a Cidade Eterna confesso a minha predileção pelas
Festas Romanas, o último a ser composto e o primeiro apresentado ontem. As dificuldades
apostas no pentagrama, na orquestração, o contraste de ritmos, a exigência dos
solos de trombone, trompa e, sobretudo, das madeiras estão entre as partituras
mais complexas que eu conheço. E tudo isso resulta leve, envolvente e sedutor.
Minhas referências são as
versões mágicas de George Schell e de Eugene Goosens. Neschling fez uma leitura
fraseológica distinta. Segurou um pouco o andamento, marcou mais os compassos
do Circus Maximus, e depois fez com que os acordes jorrassem naturalmente. Na
parte central da peça permitiu que os solistas brilhassem sem jamais
encobri-los. Respirou fundo para atacar a Epiphania e a orquestra atenta
correspondeu. Acatou os comandos com precisão e enfrentou aquela loucura
sinfônica com garbo e elegância.
Vô querido, foi perfeito.
Você teria se orgulhado.
Nas fontes, sobretudo na
descrição da Fontana de Trevi ao meio dia, as trompas deram um show ao arrancar
o carro de Netuno no meio das águas. E os trompetes, mágicos, insistentes. Que
beleza!
Finalmente os Pinheiros, a
mais intimista das três, com vento entre
as suas folhas, a sombra, os pássaros e finalmente a marcha das hordas na via
Appia.
A diferença deste concerto
foi a apresentação de um espetáculo vídeo-cênico criado pelo grupo catalão La
Fura dels Bals, com imagens selecionadas e captadas pelo fotógrafo francês Emmanuel
Carlier. A ideia é induzir o público na compreensão da música e compor um
espetáculo multi modal.
Este modelo foi
apresentado em Caracalla e em outros teatros da Europa. A concepção de Carlier
com La Fura sob a música de Respighi foi considerado um dos melhores
espetáculos apresentados no ano passado. Ontem, dividiu opiniões.
Tá legal vô. Também acho
que o Respighi não precisa disso. Nem o Orff, nem o Holst e muito menos o
Richard Strauss. Mas, vamos combinar: o teatro estava lotado. Os ingressos para
o concerto de hoje estão esgotados e teremos que fazer uma apresentação extra
na terça. E é só o começo da temporada. Estamos todos ansiosos pela 4ª.
Sinfonia de Mahler, sem La Fura.
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