sábado, 11 de janeiro de 2014

Acendam a luz, por favor!










- Alo, alo, alguém me ouve¿ Ola, ola, tem alguém ai¿

Em meio ao nada. Perdido no espaço, sem referência conhecida. Apenas com um celular nas mãos, cuja luz é a única que lhe ilumina o rosto.

Parece uma cena de Brecht e não faltariam uns acordes dissonantes de Kurt Weill, no fosso. Consigo ouvir até o trinado irritante do trompete abafado.

O non sense e a solidão serão mesmo as marcas do milênio¿ As vezes fico imaginando se os portentosos avanços tecnológicos, sobretudo da revolução digital, não impuseram um padrão de convivência insuportável. A privacidade foi para o ralo. A infovia abriga hoje todo o exibicionismo e demais desequilíbrios psicológicos de comportamento possíveis.

Outro dia me deparei com uma situação rigorosamente inusitada. Levantei o telefone para corrigir uma informação, cuja fonte era eu mesmo. Ouvi do outro lado: “Legal, mas você pode me mandar um email¿”

Ontem, no sentido contrário ao que eu estou dizendo, um órgão do Judiciário distribuiu um press-release no qual lamentava e denunciava a ausência de representantes da Prefeitura, do Governo do Estado e da União, em audiência pública onde se pretendia discutir o tema crack. Zelosa, a assessoria de imprensa deu-se ao trabalho de anexar a ata do encontro.

Qual não foi a minha surpresa ao constatar que secretários do Estado e do Município não só haviam assinado a ata, como registraram intervenções importantes no debate.

Questionado, o órgão saiu-se com essa: “O procurador mantém as informações porque estes secretários não apresentaram uma procuração que os autorizassem a falar em nome do prefeito ou do governador”.

Por favor não riam. É engraçado, mas é dramático.

Ninguém lê mais nada. Ainda ontem um repórter de um importante jornal da cidade publicou um título equivocado sobre declaração do prefeito. Preparei-me com todos os argumentos possíveis para derrubar a chamada. Do outro lado da linha me atendeu o editor. Chamei a atenção dele para o equívoco estampado no portal. Ouvi do outro lado: “Você tem razão. Não tinha lido o título”.

Como assim¿

Gostaria muito de acreditar que há de fato uma grande conspiração contra tudo e contra todos. Não há. O que existe é uma onda, um tsunami de mediocridade, um sentimento desesperador de solidão, uma falta de referência e um sem sentido nas coisas. Um desejo incontido de ser protagonista de alguma coisa, ainda que por alguns segundos.

E o ridículo¿


Isso não existe mais. As pessoas perderam esta noção. Perderam a vergonha.

Um comentário:

  1. Você disse tudo que sinto e não consigo dizer por mim mesma. Por que será!!!

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