domingo, 16 de setembro de 2012

O zippo, o desodorante e as velhinhas contrabandistas



O clássico isqueiro Zippo: uma séria ameaça a segurança aérea



Alguém já disse que atividades de inteligência não combinam com a ação burocrática da polícia do Estado. Por esta razão, a entrada ou saída de um aeroporto – e esta não é necessariamente uma característica latino-americana – é sempre uma surpresa. Por exemplo, qual a razão para que se tire um lap top ou um tablete na hora de passar no raio-x. Ou, porque um isqueiro tipo zippo é considerado um perigoso instrumento que atenta contra a segurança de um voo internacional?

Como dizem os argentinos, nada!

Não há uma maldita explicação para isso. Apenas algum gênio do alto da sua sabedoria e da sua postura burocrática, decretou que um isqueiro é um perigo, mesmo que seja um bic. E pronto.

Certa vez, embarcava em Brasília e durante o raio x implicaram com um tubo de desodorante. Tomaram. Andei menos de 10 passos. Entrei na Free-Shop e comprei exatamente o mesmo frasco, com o agravante que estava cheio, e embarquei sem nenhum problema. Qual é a lógica?

Não há lógica. Há sim uma clara intenção de criar constrangimento. Se o meu tubo de desodorante era um atentado de tal maneira violento que permitia ao agente do estado se apropriar dele. Por que o mesmo tubo comprado na free-shop não era?

Nunca vou me esquecer de uma cena que testemunhei na ponte da amizade, em Foz do Iguaçu, na fronteira com a República del Paraguay. Uma excursão de avós caiu provavelmente no mau humor do delegado de plantão, que decidiu que as velhinhas seguramente estavam atentando contra a economia nacional. Todas desceram do ônibus já escoltadas por agentes com coletes a prova de bala, bombas de efeito moral, metralhadoras e fuzis de repetição. Levadas para uma sala foram obrigadas a abrir todos os presentes que compraram no comércio de Ciudad del Leste, para netas, noras, genros, filhos e assim por diante. Os agentes com uma delicadeza jamais vista, rasgavam os pacotes e os embrulhos. Certamente imaginaram ver nas páginas dos jornais a manchete: Polícia Federal descobre conexão sexagenária na fronteira.

Que pasó? Nada.

As velhinhas voltaram para o ônibus com seus presentes totalmente decompostos. A maioria com a pressão arterial bem alterada e o alívio da sensação de que seriam condenadas a viver seus últimos dias em um presídio sobre a acusação de contrabando.

Aliás, são comuns as batidas em ônibus fretados exclusivamente em São Paulo, Curitiba, Rio ou Brasília para transportar as famosas sacoleiras. Enchem os bagageiros com bagulhos de toda a sorte, para revender com pequeno lucro e desconto das despesas de viagem. Os valentes agentes da Receita Federal, defensores intransigentes da equidade republicana, não raro confiscam tudo. Como se estas pobres famílias suburbanas, muitas das quais sem encontrar outro meio de subsistência, fossem perigosos contrabandistas, tentáculos de máfia ou dos cartéis colombianos de drogas.

Em Brasília, capital da República, existe uma célebre Feira de Importados, também batizada de rua do Paraguay, onde se pode comprar desde uma cafeteira italiana, lap tops e todos os produtos made-i n-paraguay que se pode imaginar. Tudo muamba! Mas, curiosamente há até uma agência do Banco do Brasil, praça de alimentação, os lojistas são bem organizados, etc... É uma das grandes atrações turísticas da capital. Assim, bem medido, instalada a cinco quilômetros da sede da Receita Federal.

Nada contra.

O problema é que a minha mãe ou a minha tia podem ser suspeitas de promover contrabando em Foz do Iguaçu. E ao mesmo tempo podem comprar o mesmo produto na rua do Paraguay em Brasília. Eu posso ser confundido com um perigoso terrorista árabe porque tentei embarcar com um tubo de desodorante ou com um zippo, instrumentos que certamente me permitiriam sequestrar um avião e lança-lo contra, vejamos, pelo meu humor atual, o centro de treinamento do Palmeiras na Barra Funda.

Quando trabalhava na Infraero dei de frente com um projeto inspirado pelo glorioso comando da Força Aérea Brasileira que pretendia colocar barreiras especiais nos portões dos aeroportos brasileiros. Estas engenhocas, quando acionadas, fariam surgir pontas de aço cujo propósito seria dilacerar os pneumáticos de qualquer viatura.

Não lembro exatamente quanto dos recursos públicos seria investido nesta indispensabilíssimo equipamento que permitira, por exemplo, impedir que sequestradores do Al-Queada, muito frequentes nos aeroportos brasileiros, pudessem ganhar as seguríssimas ruas e avenidas das cidades brasileiras. Mas, era uma baita grana. Outra coisa que me chamava à atenção era que a metragem dos portões nunca batia. Coisa que, aliás, parece recorrente na administração pública: a eterna dificuldade em conviver com o sistema métrico-decimal.


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