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Casario setecentista de Cartagena de Las Indias : conservado e com vida |
A
primeira surpresa propiciada por esta Cartagena de Las Índias, na
Colômbia, é o esmero com que o sítio histórico tombado pela
Unesco nos anos 80 do século passado é tratado pelos seus
habitantes. Não se trata de um casario setecentista, mas de uma
cidade viva, atraente, com comércio pulsante, hotéis e restaurantes
de qualidade, escolas e universidades.
Cercada
por uma muralha construída no século XVII, permite antever a força
da exploração espanhola, as marcas da independência colombiana,
com os dísticos gloriosos dos bolivarianos de Simon, e os sinais dos
confrontos com piratas e corsários ingleses e holandeses.
Ao
contrário dos portugueses, que nunca souberam o que fazer com as
colônias sulamericanas, os espanhóis desenvolveram uma verdadeira
máquina de exploração e de logística nas chamadas Índias
Ocidentais. Transformaram as ilhas de Cuba e de Santo Domingo em
verdadeiras plataformas espaciais, onde as riquezas eram embarcadas
em grandes galeões para cruzar o Atlântico. Paralelamente
transformaram seus principais portos continentais, Vera Cruz, no
México, e esta Cartagena, na Colômbia, em verdadeiras fortificações
militares.
O
maior problema dos espanhóis durante muito tempo foi entender o
clima no Mar do Caribe, o que levou muitas de suas embarcações ao
fundo do mar.
Cartagena
tem sua paisagem dominada por um dos mais eficientes fortes militares
já construídos no Novo Mundo: a fortaleza de San Felipe de Barajas.
Projetado e construído por um italiano de nome Antonelli
(provavelmente toscano), ele foi erigido com pedra de coral retirada
do mar e possuía nada menos do que 180 canhões de tal forma
dispostos que cobriam todos os 360 graus de visão. Suas paredes são
inclinadas de forma a repelir o bombardeio de canhões inimigos e
impedir o impacto dos projéteis, eventualmente arremessados.
A
principal batalha de Cartagena se deu na primeira metade do século
XVIII, depois que um pirata ou corsário de nome Robert Jenkins, foi
aprisionado em abril de 1731, por um guarda costas espanhol. O
capitão Julio Leon Fandiño, não satisfeito, ainda cortou a orelha
de Jenkins e o mandou de volta a Jamaica, não sem antes dizer “Ve
e dile a tu rey que lo mismo le hare si a lo mismo se atreve”.
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Com minha filha Nina: fortaleza indevassável de Barajas |
O
clamor britânico foi tremendo. Jorge II, o rei inglês, ungiu Edward
Vernon comandante da frota britânica organizada na Jamaica, que
atacou Porto Bello, hoje no Panamá, e mais tarde a fortaleza de
Cartagena, principal porto espanhol no Caribe.
O
ataque a Cartagena só seria superado em volume pela Invasão da
Normandia, em 6 de junho de 1944. Nada menos que 186 navios e mais de
27 mil fuzileiros. Mal sabia Vernon que o esperava um dos mais
brilhantes generais espanhóis de todos os tempos. Um estrategista à
frente de seu tempo, marcado pela guerra de forma indelével, Blas de
Lezo, chamado de Médio Hombre, por ter perdido uma perna, um braço
e um olho em outras batalhas.
Blas
de Lezo contava apenas com três mil homens entre soldados e milícia
urbana. Informado das intenções britânicas, afundou um pequeno
navio de forma a bloquear uma das entradas do porto. E se preparou
como pode para enfrentar os britânicos. O cerco começou no dia 13
de março de 1741.
Vernon
cometeu o erro de achar que dominado o porto teria dominado também a
cidade. Os espanhóis entrincheirados no forte de San Felipe de
Barajas receberam o que seria o ataque definitivo na noite de 19 de
abril. Foi então que a surpreendente engenharia do forte fez a
diferença. Os ingleses não conseguiam firmar posições e acabaram
imobilizados apesar dos bombardeios contínuos dos navios.
Lezo
deu ordens para a artilharia quando os granadeiros ingleses estavam
encurralados diante das muralhas. Foi uma mortandade sem precedentes.
Na aurora do dia 20, os espanhóis desceram do forte e massacraram os
assaltantes. Nada menos do que seis mil soldados britânicos foram
mortos apenas nesta manhã. Vernon recuou para os barcos, levantou o
assédio e no dia 9 de maio, deu meia volta e dirigiu-se a Jamaica.
Foi a maior derrota naval britânica de sua história.
Escravocratas
portugueses
Outra
revelação impressionante desta Cartagena das Índias é a
história de São Pedro Claver, canonizado por Leão XIII, em
1888. Jesuíta, ele chegou a Colômbia no início do século XVII,
como missionário, se ordenou padre em Santa Fé de Bogotá.
Dedicou-se, e aí vem a surpresa, a amparar escravos negros que
eram trazidos por empreendedores portugueses para trabalhar na
indústria de extração de riquezas espanhola. Ou seja, os
traficantes lusitanos já alimentavam esta malfadada atividade,
aprisionando negros em Serra Leoa, Angola e outras colônias
portuguesas na África, desde o final do século XVI, quando no
Brasil e nos países ao sul, Paraguai e Argentina, os jesuítas
ainda estavam as voltas com a escravidão indígena.
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Agora sim conseguir ler com calma. Estou convencendo meu marido a me levar pra lá.
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