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Portari e Kovalevska: Rodolfo e Mimi apaixonados no segundo ato |
Certamente La Bohème é a
ópera que mais vezes eu vi nos palcos. Vi em Londres, em Paris, em Milão, em
Buenos Aires, em Santiago, em Nova York, em Pádua, em Nápoles, em Veneza e,
claro, em São Paulo.
Aliás, embora tenha
estreado em solo brasileiro no Teatro da Paz, de Belém, em 1900, quatro anos após a première em Turim,
sob a regência de Arturo Toscanini, esta obra prima de Puccini guarda uma
estranha e simpática relação com São Paulo, mais precisamente com o seu Theatro
Municipal.
Puccini é um gigante capaz
de embasbacar um profundo conhecedor ou um completo neófito. Suas árias e
duetos são extremamente populares. Principalmente nas óperas mais conhecidas,
Manon Lescaut, Tosca, La Boheme e Madame Butterfly. Trata-se de um quarteto
capaz de encher os teatros de ópera de todo o mundo, tantas quantas récitas
forem montadas.
Há várias formas de se
encenar Puccini, desde a mais singela, em forma de música de cantina, até as
monumentais interpretações que consagraram cantores e maestros.
La Bohème é quase uma
brincadeira. A história de quatro estudantes miseráveis na Paris dos anos 70 do
século XIX, que vivem em uma república apertada, e as peripécias de uma
professora de canto mais a solidão de uma florista que desenhava rosas e lírios
sem perfume.
Rodolfo, o poeta que
escreve, se apaixona pela florista Mimi,
sua vizinha que o incomoda em hora imprópria; Marcelo, o pintor, sofre com o
poder e a sensualidade de sua amada, Musetta; Coline e Schaunard (o músico e o
filósofo) mais se divertem que qualquer outra coisa. Afinal, a comédia é
estupenda!
Mas, se o libreto é
simples assim, a música de Puccini propõe um desafio tremendo: fazer soar
simples, melódico e envolvente. Dois exemplos marcantes de dificuldade, o
segundo ato praticamente inteiro e o quarteto do final do terceiro ato. Muita,
mas muita música!
Esta La Bohème que o
Theatro Municipal de São Paulo apresenta em sete récitas e dois elencos neste
início de maio ainda acrescenta algumas novidades extremamente bem-vindas. A
concepção cênica de Arnaud Bernard e os figurinos de Carla Ricotti criados para
a primeira apresentação em 2013, e que se incorporaram ao repertório definitivo
da nossa casa de ópera. Juliana Santos a diretora da remontagem conseguiu ainda
dar mais vigor, mais espaço, para um cenário tão criativo.
Os dois elencos por sua
vez fizeram duas interpretações completamente diferentes: Cristina Pasaroiu e
Ivan Magri fizeram Mimi e Rodolfo mais
introvertidos, mais sérios, enquanto Mihaela Marcu e Mattia Olivieri, como
Musetta e Marcelo, se encarregaram de um show não só na interpretação vocal
como cênica. Na outra versão, ocorreu exatamente o contrário, Maija Kovalevska
fez uma Mimi vigorosa, rara, e Fernando Portari fez um Rodolfo mais engraçado,
despreendido e apaixonado; Zheng Zhong Zhou e Anna Maria Sarra, por sua vez,
deram tintas mais sofridas aos seus personagens.
O coro lírico e a
Orquestra Sinfônica Municipal, em comparação com a récita de 2013, permitiram
visualizar de forma escancarada a evolução destes dois corpos estáveis nestes
últimos anos. O maestro residente da OSM, o jovem Eduardo Strausser , passeou
pela partitura com uma naturalidade impressionante. Sabia que a orquestra
atenderia sem esforço a sua condução. O resultado dignifica uma partitura tão
rica em harmonias e melodias.
O maestro John Neschling tem razões de sobra
para se orgulhar de seu assistente e, principalmente da orquestra que ele
recriou e que nunca, repito, nunca na história de 105 anos do Theatro Municipal
atingiu um nível técnico de excelência profissional como agora.
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Eduardo Strausser, maestro residente da OSM: orgulho de Neschling |
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