Um jornalista sério, chamado Pier Luigi Vercesi, editor da revista Sette, que sai encartada todos os domingos no vetusto jornal milanês Corriere della Sera, escreve um corajoso editorial sob o título de Todo o cinismo do mundo e que começa assim: "Um não-leitor me escreve um e-mail dizendo que não compra livros, não compra jornais, mas alimenta um blog. E, segundo ele diz, acreditava que o mundo fosse uma fábula. Sempre tentaram encontrar racionalidade na realidade, para fazer um mundo melhor. Mas nunca conseguiram".
Concordo com meu colega Vercesi, todos nós temos histórias de ilusões e desilusões, vitórias e derrotas, alegrias e tragédias. E como o não leitor que se chama Giuseppe, podemos fazer reflexões sobre o mundo, a vida e o futuro. Incomoda bastante que o não-leitor se refere aos outros, como se ele não fizesse parte deste conjunto de ideias e sentimentos contemporâneos.
Vercesi termina o artigo com uma forte citação de David Grossman:"A incapacidade de acreditar em uma situação melhor é o começo da derrota". E sentencia brilhantemente:" O nosso mal (referindo-se aos tempos atuais), pessoal e de toda a sociedade, é o cinismo. Os cínicos ridicularizam a tudo e se dizem incapazes de mudar as coisas. Creio que seja um mal congênito, ainda que não de todos".
De repente, me transportei para o Brasil, onde não-leitores como Giuseppe chamam para si o direito de dizer a verdade e se avocam o papel de profetas. Numa sociedade cínica como um "cambalache" , problemático e febril, já não importa mais a verdade ou a utopia. Aqueles que não compartilham do pensamento geral estão fora, fossilizados. Como a grande Anita, uma mulher extraordinária, que vendia um copo de leite em um grande outdoor romano, e levava um puritano, ou falso puritano, a loucura.
Anita cansou-se do mundo. Preferiu terminar seus dias reclusa com seus cães em uma vila romana. Abdicou do cinismo, ao menos. Gg
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