Ponto de reflexão: na bela Cefalu, diante do Mar Tyrreno, a contradição mágica da ilha da Sicilia |
Fabrizio de Salinas era
seguramente o último príncipe bourbonico da Sicilia. Foi o único que não correu
de Garibaldi, no primeiro episódio do Risorgimento, o célebre desembarque em
Marsala. Lampeduza escreveu e Visconti filmou com maestria a saga deste
aristocrata apaixonado pela juventude do sobrinho Tancredi de Falconieri. Ele
entendeu rapidamente que as coisas deveriam mudar para ficar exatamente como
estão.
O livro é brilhante, o
filme também.
O diálogo com o enviado de
Vittorio Emanuelle, o primeiro rei da Itália, que queria oferecer-lhe uma
cadeira no Senado, é ainda mais elucidador do espírito siciliano: “Fico lisonjeado
com o convite. Mas, nós sicilianos estamos dormindo e preferimos ficar assim,
sonolentos, sem atentar muito para a realidade, por uma razão simples: somos
perfeitos”.
O final da história é
melancólico: Fabrizio descobre que a nova ordem preservava a aristocracia e a
monarquia. Esperava sinceramente que a Itália progredisse e se colocasse no rol
das grandes nações do mundo. Mas, para ele não sobrara nada. Nenhum lugarzinho
no mundo.
No filme o casal Tancredi
(o sobrinho) e Angélica (a vistosa filha do burguês Calogero Sedara) termina apaixonado
e grato ao Zione. No livro o desfecho do romance dos dois é uma farsa.
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Burt Lancaster como Fabrizio: sorriso irônico, olhar dominador, sem lugar na nova ordem |
Estes oito dias na Sicilia
e quinze na Itália me provocaram muitas reflexões. A de Lampeduza, sem dúvida,
veio a minha testa como uma bala. Como pode uma ilha tão bonita e tão rica em
história e cultura, com sinais das dominações árabe, normanda, espanhola,
romana e, sobretudo, grega, ser tão pobre e tão violenta?
O pequeno aeroporto de
Palermo leva o nome do juiz Falconi. As ruas da cidade tem várias homenagens ao
general Dalla Chiesa. Dois nomes
importantes no combate ao crime organizado, assassinados pela máfia.
Sinal dos tempos. Muitos
sicilianos deixaram a ilha em busca de outras oportunidades, na América do Sul,
na Oceania e até na Alemanha. Talvez a maior população siciliana viva em Milão
e Turim. Hoje, algumas ruas de Catania e de Palermo são verdadeiros guetos
africanos, indianos, chineses e assim por diante. E ainda assim, tudo continua
como sempre esteve. Nada muda.
Taormina ainda é um dos
sítios naturais mais encantadores do mundo. O Etna segue lá, fumando
eternamente. A Villa Bellini, em Catania, a catedral em Palermo, Siracusa,
Ragusa, Agriggento, Messina. Mas, é nas pequenas vilas como Cefalu, no Tirreno,
onde Tornatore rodou uma cena de Cinema Paradiso, que ainda se pode ver o príncipe
de Salinas e seu sorriso irônico. Ele anda pelos becos e pelas ruas estreitas,
com sua bengala e sua cartola, suas suíças bem aparadas e aquele olhar
dominador.
belo texto ;;;
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