segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Craque nos campos e craque na vida

Tostão, ou dr. Eduardo: brilhante nos campos como atleta e como homem




Uma das figuras mais apaixonantes que eu conheci na Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos, foi o grande Tostão – na verdade, Eduardo Gonçalves de Andrade, um dos mais geniais jogadores que eu conheci no campo de jogo.
Tostão fazia sua estréia como comentarista esportivo e eu tive a clara impressão que ele não se sentia à vontade no meio dos colegas, sobretudo daquela torrente de vaidade que assoma os jornalistas televisivos.
Numa noite em Dallas, eu havia jantado com o Roberto Rivelino (outro cara acima da média como homem, como jogador e como estudioso de futebol) e quando voltamos para o hotel encontramos o pobre do Tostão só, no lobby, se entretendo com a leitura de um livro de Marcel Proust. 
Começamos a conversa por aí. Rivelino manifestou tremenda curiosidade. E fomos os três falando e falando e falando. Assistimos à chegada dos colegas das emissoras de televisão. Alguns ainda ensaiavam participar da conversa. Mas, para nossa sorte, logo se afastavam e desapareciam pelo gigantesco saguão. E nós fomos ficando e ficando e ficando, até que amanheceu o dia.
Que papo formidável! Histórias de vida e de convívio. Que desprendimento!
Rivelino e Tostão possuem a humildade dos sábios.
Tostão, por sua vez, é fissurado no conhecimento humano, no estudo do comportamento. Cheguei à brilhante conclusão que ele não daria certo no cenário que se montava para ele. E não me surpreendeu quando ele decidiu abandonar tudo e ficar apenas com a coluna dominical da Folha. E mesmo assim, vejam que preciosidade foi a coluna do último domingo, dia 31:


Tostão e Rivelino: dois craques da vida que eu conheci na Copa




ONTEM, COMEÇARAM, oficialmente, a festança e a gastança da Copa de 2014, com um evento pago pela prefeitura e pelo governo estadual do Rio, com a presença e o apoio dos amigos, novos e antigos. Todos querem mamar nas tetas do poder.
A agressão do jogador Gustavo, do Sport, ao atleta Elivélton, do Vasco, pela Taça BH de Juniores, mesmo mais grave que outras, tem a ver com a violência que existe na sociedade, nas ruas, nas arquibancadas e nos gramados. As partidas são, a cada dia, mais tumultuadas, com cotoveladas, pontapés e ofensas. Muitos chamam isso de futebol competitivo, emocionante e intenso.
O espetacular jogo entre Santos e Flamengo foi atípico e uma exceção. Neymar e Ronaldinho foram magistrais, facilitados pela péssima atuação individual e coletiva da maioria dos defensores. O gol de Neymar foi tão bonito quanto os maiores gols de Pelé.
Os jovens, encantados, ficaram perplexos. Parecia outro esporte, que existia apenas na imaginação dos saudosistas e dos românticos. Os mais velhos, assim como eu, emocionados, lembraram os grandes jogos entre o Santos, de Pelé, e o Botafogo, de Garrincha.
Difícil é voltar à realidade. O futebol atual é outro. Quanto mais violência nos gramados, mais se fala em fair play. Jogar a bola para fora quando o adversário está no chão, o que deveria ser um ato espontâneo, de solidariedade e de delicadeza, tornou-se uma obrigação, muitas vezes, sem motivo. Alguns jogadores se aproveitam para simular contusões graves. É o árbitro que deve decidir se para ou não o jogo.
O esporte de alto rendimento é um espelho da sociedade. Não é um bom lugar para incorporar os valores éticos. O atleta, pressionado e sonhando com a glória, costuma usar de todos os meios para levar vantagem. Mesmo com tantos exames, os atletas continuam se dopando.
O ser humano não nasceu santo. Nasce, cresce e corre atrás do prazer. É a sociedade que tem de impor limites para desmedidas ambições humanas, por meio de educação, exemplos e punições.
Os atletas se preparam somente para vencer. Além da tristeza, os derrotados se sentem moralmente culpados, como se tivessem feito algo incorreto.
A sala onde os nadadores ficam, antes de uma prova olímpica, é chamada de sala da morte. Quem perde morre.
Tenho mais admiração pelos perdedores, pelos marginalizados e pelos inadaptados ao mundo, que, mesmo assim, continuam dignos, do que pelos vencedores, apaixonados pelo sucesso.


Tostão foi um grande jogador de futebol. Muito maior do que Ronaldinhos, Neymares e quetais. E tornou-se maior ainda fora dos campos. Tenho muito orgulho de tê-lo conhecido pessoalmente e de ter convivido umas poucas horas, que me valeram muito. Obrigado, Dr. Eduardo!


Nenhum comentário:

Postar um comentário