segunda-feira, 5 de março de 2012

Um pouco de cinema para pensar


Berenice Bejo e Jean Dujardin: astros de um filme mudo em pleno século XXI

Glória Swanson ou Norma Desmond: uma estrela superada pelo cinema falado





Não sou de me ligar muito na premiação da Academia. No passado, gostava muito do show. Ultimamente nem isso. Mas, me chamou a atenção que quando Michel Hazanavicius subiu ao palco este ano para receber o Oscar de melhor diretor por esta jóia chamada O Artista, tenha feito uma reverência ao diretor Billy Wilder.

Na verdade, para quem não sabe, trata-se de um dos mais profícuos e excepcionais diretores e roteiristas do cinema americano. Nascido Samuel, na Polônia em 1906, faleceu em 2002. Fez mais de 60 filmes, incluindo Sunset Boulevard, que levou o Oscar de roteiro original em 1950.

Pessoalmente incluo Sunset Boulevard (1950) ou Crepúsculo dos Deuses, como chamou em português, entre os três mais importantes filmes que Hollywood legou a humanidade no século XX. Em sua companhia coloco o sempre genial Cidadão Kane (1941), de Orson Wells, e Vinhas da Ira (1940), de John Ford, baseado no livro homônimo de John Steinbeck, que o levou ao Nobel de Literatura em 1962.

Crepúsculo, vamos chamá-lo assim, entretanto, é um filme que foi criado e escrito para ser um filme comum, sem maiores rapapés. Wilder vinha de um sucesso estrondoso com Farrapo Humano (1945). Na hora de selecionar os atores, apelou para seu amigo Erich Stroheim, que faz o mordomo e indicou Glória Swanson para o papel de Norma Desmond. Para o papel de Joe Gillis, sua primeira inclinação era por Monty Clift, que recusou. William Holden não filmava há tempos e acabou sendo a opção que estava à mão. Nancy Olson, que fecha o quarteto de protagonistas, era uma atriz iniciante, que jamais havia filmado.

A magia do cinema juntou um texto extraordinário com atores como Glória e Erich que interpretavam a si mesmos. Ambos viveram as glórias do cinema mudo e se o ator alemão ainda sobreviveu no genialíssimo As Cinco Covas do Egito, do mesmo Wilder, e no diametral A Grande Ilusão, de Jean Renoir, a atriz americana experimentou um ostracismo de mais de 20 anos até voltar as telas.

Curiosamente os dois foram personagens de um dos maiores fracassos da história do cinema: A Grande Rainha. Stroheim deu uma pirada, gastou uma fortuna, e o filme simplesmente não funcionou. Por sorte, quando eles se reencontraram já tinham aparado esta desgraça.

Wilder conquistou o Oscar de roteiro original, mas ganhou uma bronca tremenda de Hollywood que entendeu tratar-se de uma crítica a indústria do cinema.

Grossa bobagem! Tanto O Artista como Crepúsculo tratam de um assunto muito mais dramático. O homem sendo superado na sua competência por uma tecnologia que ele não domina. E não foi só no cinema. A revolução digital está aí para ilustrar bem esta situação.

O roteiro de Wilder tem um mérito que o de Hazanavicius não tem. Crepúsculo é contado por um personagem morto, boiando em um piscina, no número 10.000 de Sunset Boulevard. Originalmente o filme começava com um diálogo entre cadáveres na morgue de Los Angeles. Mas, no teste o diretor se incomodou porque as pessoas acharam hilário e riram muito. Era para ser apenas engraçado. Não cômico.

O Artista é uma produção franco-belga, rodado nos Estados Unidos. Entre tantos méritos tem um especial. Provoca uma grande reflexão: custou apenas US$ 15 milhões. Hugo, outro grande filme, de Martin Scorsese, custou US$ 175 milhões. Um é singelo, apóia-se na direção de arte, é mudo, tem em Jean Dujardin e Berenice Bejo dois atores excepcionais, uma grande fotografia, em preto e branco e um roteiro memorável. O outro filme tem tudo o que o cinema pode oferecer, incluindo efeitos especiais e fotografia em 3D.

Nada contra a modernidade. Mas, que é para se pensar, isso é.

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