domingo, 27 de novembro de 2011

Que autocritica? Estamos bien, siempre!

A sempre encantadora Buenos Aires: portenhos agora falam sozinhos, ao celular.



A vida nos revela surpresas e doces equívocos. Convidado para falar sobre financiamento público da educação em um seminário do Centro de Estudos de Políticas Públicas, seria difícil para eu recusar. Ainda mais pelo calor de sempre da recepção de Natalie, de Alejandra, de Gustavo e de toda a turma. Assim, ainda que atrasado por um dia, tive o privilégio de passar algumas horas em Buenos Aires. Senti o cheiro da cidade, ouvi seus ruídos, ainda que desta vez tenham me hospedado em um novo hotel, chamado Scala, muito mais perto de Constituicion do que de Retiro, na avenida Bernardo Irigoyen, entre Independencia e Chile.

Confesso que temi por minha sanidade mental, que já não anda estas coisas, quando constatei que os portenhos tinham adquirido o estranho hábito de falar sozinhos enquanto caminhavam. Que hábito esquisito! Será que ficaram todos loucos? Ou quem enlouqueceu fui eu?

Perguntei a Emiliana Vegas, uma doce venezuelana, diretora do BID, que vive em Washington. E ela me disse:

- Ufa! Que bom. Eu também pensei que havia enlouquecido.

Enfim, perguntei a Nat, o que estava acontecendo. E este anjo portenho enfim nos esclareceu:

- Nunzio, que te pasa? Es que los argentinos estan apassionados por uma nueva conquista, los auriculares telefônicos. No hablan solos. Estan hablando en el celular por el microfono móvel.

Menos mal.  Quanto ao seminário, as constatações de sempre. Como é possível falarmos em unidade regional se não nos acertamos nem mesmo com relação a uma simples tomada? E isso, ao contrário dos auriculares telefônicos não é um privilégio dos argentinos. Ainda que suas tomadas sejam de uma complicação que lembra, sei lá o que. Mas, é engraçado que um adaptador chinês, capaz de abrigar a todo tipo de tomada e de ser conectado até com o padrão ( ou não padrão) argentino, seja objeto de consumo de todos aqueles que precisam carregar seus celulares ou simplesmente ligar seus computadores.

Apesar das tomadas, temo que a questão da unidade regional se torne algo que se persegue sempre, porém não vamos alcançar nunca. Algo assim como Michele Pfeiffer angelical que aparece nos nossos sonhos e que quando estamos muito próximos de toca-la despertamos.

Pfeiffer é americana. Eu pessoalmente acho que ela é extra-terrestre. Mas, para que não me puxem as orelhas vamos ficar com Salma Hayek e Soledad Villamil. Já que é para sonhar, vamos logo chutar para cima.

Falamos, falamos e falamos. Já sabemos que Argentina, Brasil, Colômbia, México e Venezuela têm que funcionar como locomotivas e arrastar aos países menores. Que Peru será sempre benvindo. Que os países do Caribe e da América Central são muito pobres e tem problemas muito sérios de organização do estado. Foi impressionante a apresentação da delegada de Guatemala, principalmente quando ela informou que 98% dos estudantes do ensino fundamental chamados a fazer uma prova para medir a proficiência em espanhol e matemática, ficaram abaixo do nível mínimo de aprendizagem.

Impressionante o esforço da República Dominicana, ponto zero da América Latina, onde tudo começou em 1482. Fizeram um acordo entre os políticos locais para, independente do resultado das eleições, definir 4% del PIB como orçamento mínimo para a Educação.

E o México? Uma delícia. Perguntei se a crise americana não lhes provocava arrepios, afinal eles tem um vizinho por demais incomodo.

- Ellos son incômodos para nosotros. Y nosotros somos incômodos para ellos. Asi que dos incômodos se anulam.

Boa resposta!

Convidado para falar no fechamento da cerimônia, quase provoco uma guerra indesejável. Justamente falava do risco que corríamos se empregássemos o ritmo diplomático para buscar a unidade que almejamos e a troca de experiências. E, sem me aperceber, fiz um apelo aos mexicanos para que discutíssemos uma auto-crítica sobre a implementação de políticas públicas durante o período revolucionário.

Até ai tudo bem. Os mexicanos adoram falar disso. Porém fiz o mesmo apelo aos irmãos argentinos em relação ao modelo sarmientista de educação, que vai completar 150 anos e que já mostra sinais de extenuamento.

- Que auto-critica? Estamos bien.

Não. Não estão. E ai reside um dos principais, se não o principal problema argentino. A revisão do modelo sarmientista, implementado pelo presidente Sarmiento depois da guerra da Tríplice Aliança, no século XIX, precisa ser revisto sim, rediscutido, até para que seja melhorado e renovado. Os argentinos ficam nervosos quando falamos assim. Aliás, me parece que isso funciona desta maneira na Educação, no futebol, na vida enfim.

- Estamos bien. Siempre!


Isso, e não os microfones auriculares, explica porque os portenhos andam falando sozinhos pelas calçadas frescas de Buenos Aires. Tenho certeza que os telefones estão desligados. Nós brasileiros durante muito tempo copiamos o hábito mexicano de falar com cavalos. Há quem diga que em Goiás, ainda há gente que desperta pela manhã e dá bom dia a sua montaria. 

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