sábado, 16 de abril de 2011

De volta para o passado

Imponência no Ibirapuera: prédio original da Assembléia Legislativa de São Paulo

Esta semana estive de volta a um cenário muito marcante na minha formação profissional. Os mais novos podem achar impossível, mas acreditem a Assembleia Legislativa de São Paulo já foi um polo de grandes ideias, de debates políticos, celeiro de grandes lideranças e palco de eventos marcantes.
Um café na sala de imprensa sempre rendia uma boa pauta. O ambiente era agradável e quase sempre rolava uma informação de cocheira. Alguns políticos da esfera federal, o então senador Montoro, por exemplo, tinha o hábito de prestigiar o legislativo estadual e toda a segunda-feira antes de embarcar para Brasília dava uma “canja” por lá. Não que eu me lembre dele ter feito alguma revelação bombástica, ou passado uma informação de derrubar quarteirão, mas sempre era um bom papo.
Era difícil cobrir a política de São Paulo no final dos anos 70 e início dos anos 80. Era preciso frequentar um circuito curioso, que começava na Assembléia, passava pelo escritório de engenharia de Mário Covas, pelos escritórios de advocacia de Gastone Righi e Almino Afonso, pela casa do presidente Jânio Quadros no condomínio Acapulco, no Guarujá, pelo escritório da dupla Airton Soares e Luís Eduardo Greenhalg, na Bela Vista, e finalmente no Palácio dos Bandeirantes, onde uma singela provocação ao governador Paulo Maluf, rendia lead seguro.
Figueiredo e Maluf: com essa os militares não contavam
Maluf é mesmo uma figura. Lembro-me até hoje do dia da sua eleição indireta na Assembleia. Eu estava designado para fazer a cobertura, mas quando sai da redação de IstoÉ a capa da revista estava pronta e a matéria redigida. A dupla Armando Salém e Francisco Barreiros havia convencido o editor Tão Gomes Pinto e o diretor Mino Carta de que a eleição de Laudo Natel era favas contadas.
Os argumentos da dupla eram de uma segurança impressionante: “O Golba (Golbery do Couto e Silva) e o Alemão (o presidente Ernesto Geisel) articularam com as bases do ademarismo, bla-bla-bla”.
Não era a informação que eu tinha. Maluf vinha como um tsunami. Mas, ninguém iria dar ouvidos a um borra-botas. Pelas dúvidas, o Tão me mandou para a Assembleia com a missão de ligar confirmando o resultado da votação.  Nada mais. Bastava dar um telefone e a revista seguiria para a impressão.
Como todos sabem, Maluf deu uma sonora lavada em Laudo Natel. E como só e acontecer, ocorreu de tudo. Cortaram a luz, o candidato sentou-se sobre as urnas. Foi um circo inesquecível. Da minha parte, guardo até hoje a lembrança do tal telefonema:
- Alo, Tão? É o seguinte, avisa o Mino que é para ele jogar a revista toda no lixo, porque o Maluf ganhou.
- Como ganhou?
- Acredite, ele teve mais votos que o Laudo. Mas, a gente pode criar uma realidade alternativa.
- Deixa de viadagem e vem logo para a redação.
Prestes: o Poeta e o Capitão
Foi na Assembleia, mais precisamente na sala de imprensa, que eu conheci pessoalmente um dos mitos que habitava o meu ser. O mitológico Luís Carlos Prestes, o cavaleiro da esperança,  um personagem que era a própria história do Brasil do século XX.
Ele voltava do exílio e ao chegar a São Paulo decidiu que o legislativo paulista seria sua primeira parada. Havia uma grande ansiedade entre os coleguinhas e ele chegou simples, humilde, acompanhado de outro monstro, Gregório Bezerra. Houve um momento de um silêncio profundo, respeitoso, quando ele sentou-se em uma cadeira e nós nos organizamos em círculo ao redor dele.
Metido como sempre, quebrei o silêncio e perguntei:
- O senhor nos desculpe, mas como devemos tratá-lo?
Prestes me olhou no fundo dos olhos, coçou o queixo, sorriu com orgulho e respondeu:
- Como senador. O último cargo público que eu conquistei e que me foi outorgado pelos trabalhadores de São Paulo.  
Foi um grande momento, uma grande entrevista, que se prolongou por mais de duas horas. Quem quiser conhecer mais sobre Prestes, recomendo o documentário do meu amigo Toni Venturi, “O Velho”, uma obra prima de sensibilidade, disponível, eu espero, nas grandes livrarias e sites de DVDs. Também recomendo a passagem sobre ele em “Confesso que vivi”, do genialíssimo Pablo Neruda, onde ele conta que veio a São Paulo homenagear o cavaleiro da esperança no Estádio do Pacaembu, quando de uma de suas inúmeras libertações. Meu amigo Jorge de Oliveira fez um vídeo maravilhoso sobre este episódio tão pouco conhecido das novas gerações.  Chama-se “O Poeta e o Capitão”.
Na quarta-feira passada acompanhei o ministro Fernando Haddad a uma audiência pública com mais de 20 entidades do movimento social na Assembleia Legislativa de São Paulo, sobre o Plano Nacional da Educação. Estava escudado pelas minhas jovens assessoras Emle e Luciana e de quebra ainda ganhei a companhia da minha filha Bianca. Lidei com a nova geração da imprensa paulista. A bela e competente Mariana Mandelli, o eficientíssimo Luciano Máximo, o impetuoso Rafael Targino e a sóbria e cirúrgica Fernanda Nogueira, que publicou notável entrevista com o ministro da Educação no G1, na manhã seguinte.
Mas, voltei para Brasília com uma trava na língua. Queria ter contado para eles que aquele cenário já havia sido grande e respeitoso. Não sei se eles iriam acreditar ou se estavam dispostos a ouvir. Como diz, uma das minhas mais amadas colegas, a Karina Yamamoto, ninguém está interessado mais em arqueologia jornalística.
- Para você ter uma ideia, eu sou veterana! – disse a pequena.
- E eu então? Sou jurássico! 

Um comentário:

  1. Há uma imprecisão numa certa parte de sua história, querido italiano doido... "Jurássica" se anunciou a Karina. Você, nós o erigimos à singela condição de "Monolito de Stanley Kubrick", hahahah.
    Que graça tem a vida sem uma boa hipérbole, hã?

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