domingo, 9 de outubro de 2011

O humor e as sub-celebridades que o tempo apaga




Sordi e Troisi: gênios do humor italiano do pós-guerra




Uma das coisas que aprendi na vida é que quando eu começo a fazer piadas e a rir de mim mesmo é porque superei aquela conjuntura. Humor diante da vida é fundamental para encará-la. Não se levar tanto a sério é fundamental para avançar. Esta digamos “filosofia” é típica de meus ancestrais peninsulares que evoluíram depois de duas guerras e uma série de trapalhadas rindo-se de si mesmos. Para ilustrar melhor poderia me reportar a imagem do grande ator Alberto Sordi e mais recentemente ao genialíssimo Massimo Troisi e até o contemporâneo Roberto Begnini, do qual confesso não morro de amores.

O papel do humor é corroer, superar, não é rebaixar ou diminuir. Não existe nada pior do que humorismo politicamente correto. O episódio protagonizado pelo ator Rafinha Bastos, do CQC, é um exemplo acabado de mau humor, machismo e preconceito. Aliás, como de resto todo o programa liderado por Marcelo Tas.

Some-se a isso uma dose cavalar de hipocrisia.

Mas, como este é o pais das sub-celebridades, da sub-cultura e da sub-sabe-se-lá-o-que, tudo bem, temos que conviver com isso e pronto.

Certa vez fui encarregado pelo Tão Gomes Pinto de fazer para a revista Manchete o perfil da novíssima atriz Thaís Araujo.  Como ela tinha 17 anos, a direção da TV do mesmo grupo esperava ela completar 18 para lançar com pompa e circunstância uma nova versão de Xica da Silva, a história da negra alforriada cuja sensualidade levou um par de portugueses das Gerais à loucura.

Foi uma completa tortura. O máximo que eu consegui tirar da jovem atriz foi uma relação entre africanidade e o tamanho de seus quadris. Mas, como papel aceita tudo... Bem, não me orgulho muito do resultado desta empreitada.

É impressionante como o brasileiro de classe média não tem humor. Ele adora rir-se dos constrangimentos e das situações inauditas vividas por aqueles inferiores a ele. Mas, quando chega nele... Êpa, espera ai...

A arte brasileira produziu comediantes extraordinários. Refiro-me a Oscarito e Ronald Golias como os mais impressionantes. Bastava olhar para a cara deles para sentir invadir uma agradável sensação de bem-estar. Grande Otelo, claro. Brandão Filho. José Vasconcelos, Chico Anysio. Jô Soares. E por trás deles, fazendo humor na máquina de escrever, o maior de todos, Max Nunes.

Os mais jovens desconhecem, mas o humor brasileiro de estilo, com graça, começou no rádio com a impagável PRK-30,  obra genial de Lauro Borges e Castro Barbosa. E a consagração veio com um programa chamado “Balança mas não cai”, totalmente criado e escrito por Max Nunes.

Capitão Gay: criação de Max Nunes e interpretação de Jô Soares
É da lavra de Max Nunes o célebre quadro do primo pobre e do primo rico, vividos respectivamente por Brandão Filho e Paulo Gracindo. É dele também a genial concepção do Capitão Gay, vivido por Jô Soares, e do Coronel Limoeiro, de Chico Anysio.

Jô Soares, aliás, antes de ser este chato de galocha, que se arvora como um Johnny Carson tupiniquim, era um brilhante escritor de humor. Foi ele quem concebeu e escreveu um dos melhores programas humorísticos da história, a Família Trapo, dirigido por Nilton Travesso e produzido pela Equipe A, da Tv Record, liderada por Tuta Amaral de Carvalho.

Certa vez perguntei para o gordo Jô como tinha sido a experiência de escrever para Golias e fazer gags para um personagem tão maravilhoso como o Bronco Dinossauro. Ele me respondeu:

- Inútil. Golias nunca seguiu um texto. Ele improvisava tudo.

Golias/Bronco: com paradinha
E foi na base do improviso que Golias, ao vivo no palco do Teatro Paramount, viveu uma das maiores gags que eu conheço: a célebre cena com Pelé, em que Bronco ensina ao rei do futebol a cobrar pênaltis com paradinha.

Não morro de amores pelo homem, mas certamente tenho que admitir que o velho Didi, vivido por Renato Aragão, é muito bom, no papel do retirante cearense que descobre com inaudito humor as maravilhas do Sul. Aliás, vejo até uma certa semelhança com o retirante de Troisi, que faz o siciliano em Milão.

Todo este modesto quadro do humor nacional apenas para concluir que Rafinha Bastos não faz falta nenhuma.  Volta com gáudio para a mediocridade de onde nunca deveria ter saído. Mais uma sub-celebridade para animar um mundo paralelo onde rola muito dinheiro, um relativo cenário iluminado, mas que com o tempo se apaga.

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