segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Histórias do fim do mundo e do além


O prédio da Manchete: abandonado até hoje

Histórias como essa da mulher louca parecem me perseguir ao longo de 40 anos de profissão. Logo após o acidente da TAM, aquele do Fokker 100 que se esborrachou no Jabaquara, soube que a Força Aérea Brasileira mantinha uma lista de sensitivos, ou pessoas com Percepção Extra-Sensorial, capazes de ajudar os técnicos a elucidar a causa de acidentes aeronáuticos.
Na época, eu era editor executivo da gloriosa revista Manchete e confesso que a história não me pareceu absurda. De tal sorte que despachei a grande repórter Christiane Ramalho para Salvador, onde descobrimos vivia uma destas criaturas.
Dois dias depois, a Christiane voltou com a história e com a mulher junto, que não continha sua ansiedade em nos fazer revelações sobre nosso futuro.
Como a hora do almoço se aproximava, pedi a Christiane que contivesse a ansiedade da mulher por mais um pouco, enquanto tentava convencer o Tão Gomes, o editor, e o Octavio Costa, o outro editor executivo a partilhar das revelações enquanto saboreávamos aquela inesquecível feijoada köscher das quartas-feiras, na cobertura do prédio projetado por Oscar Niemayer no bairro da Glória.
Ainda me lembro que da janela do refeitório podíamos ver o porta aviões Minas Gerais fazendo manobras no meio da Baía da Guanabara, quando a Christiane apresentou aquela criatura aparentemente adorável. E ela não se fez de rogada:
- Quero avisar vocês que isso aqui não vai a lugar nenhum. Esta empresa está falida. Todos vão perder o emprego!
A mulher ficou aterrada com a nossa reação. Todos começamos a rir.
- Vocês não me acreditam?
- A senhora não nos leve a mal. Mas, digamos que não é preciso ter percepção extra-sensorial para saber disso.
Em meio a garfadas de maxixe e lingüiça de vitela, a mulher riu e continuou a falar no nosso futuro.
- Este edifício vai ficar abandonado por muito tempo. Vocês três vão viver juntos em outra cidade, provavelmente em Brasília, mas só dois de vocês vão criar raízes.
Em seguida apontou para o Tão e disparou:
- Você não vai agüentar e vai viver em uma cidade do Interior, provavelmente de São Paulo.
Para mim ela reservou duas bombas:
- Você vai voltar a trabalhar com política, vai trabalhar no governo, e vai ganhar outro filho, provavelmente uma menina.
Terminamos o almoço de forma civilizada. Agradecemos a companhia da vidente e  ainda pedimos para a Christiane cuidar para que ela embarcasse de volta com conforto e segurança.
Ainda me lembro que a Christiane nos premiou com uma bela reportagem, que eu editei com bastante disposição.
Pode ter sido apenas uma coincidência, mas eu, o Octávio e o Tão, nos reencontramos de novo em Brasília. Aqui trabalhei no Senado e depois integrei o governo do presidente Lula desde o primeiro dia. O Octavio ainda é o diretor da sucursal da revista Istoé. E o Tão, depois de algum tempo, mudou-se para Indaiatuba.
No dia 4 de outubro de 1998, minha esposa Rejane me deu uma filha linda chamada Nina. E o prédio da Manchete, na rua do Russel, na Glória, continua abandonado até hoje.
II

Outra história da Manchete que eu nunca vou esquecer, guarda relação com o saudoso jornalista Ney Bianchi.
Ney era um dos editores de Manchete e eu tinha por ele verdadeira adoração. Não por nada, mas apenas porque o considerava um dos mais talentosos jornalistas esportivos da geração anterior a minha.
Uma de suas principais obsessões, no entanto, era o fenômeno paranormal do dr.Fritz. Ele havia entrevistado o médium Arigó, que recebeu pela primeira vez o espírito do médico alemão, catalogara suas outras manifestações, viajou para a Europa e confirmara informações que recebera do próprio espírito.
Escreveu um pequeno opúsculo, aliás muito bem escrito, onde revelava que o dr.Fritz na verdade se chamava Adolf e teria desencarnado  durante a I Guerra Mundial, quando um obus russo penetrou dentro do hospital onde ele trabalhava, na célebre batalha de Tannenberg.
Adorei o livro. Adorei o assunto. Mas, por alguma razão deixei o trabalho do Ney hibernando na minha gaveta.
Ele sempre me cobrava e eu respondia:
- Nesta semana Ney, eu mesmo vou escrever.
E ele respondia:
- Nunzio, enquanto eu estiver cobrando tudo bem, quando o alemão te cobrar você vai se assustar.
Assim foi até que numa manhã despertei acometido de violento e inesperado ataque de hemorróidas. A dor era tão violenta que se irradiava pelas costas e pelas pernas. Só penei mais, recentemente quando tive que expelir alguns cálculos renais.
As palavras do Ney não saiam da minha cabeça. Mas, eu estava tão mal que sequer me achava capaz de dirigir.
Tomei um taxi, mas minha aparência era tão sofrida que o motorista insistia em me levar para o hospital.
Nem sei como consegui escrever. Não havia analgésico capaz de atenuar a dor que eu sentia. Finalmente no início da noite, depois de um suplício tremendo, coloquei a última legenda, revisei o último parágrafo e soltei, com toda a força dos meus pulmões a palavra mágica de 10 entre 10 jornalistas.
- Deeeeesce!
Como em um passe de mágica, a dor sumiu. As hemorróidas desapareceram.

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