quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Um café em Congonhas

Inauguração em 1936: Vista aérea do remoto Aeroporto de Congonhas
Algumas horas em São Paulo e um café sempre gostoso, em minutos, com minha amiga Ana Laura Haddad, competentíssima chefe da comunicação do Aeroporto de Congonhas. Aninha é uma das boas amigas que me sobraram do período de quatro anos em que trabalhei como superintendente de comunicação social da Infraero, a falecida estatal que cuida dos 65 principais aeroportos brasileiros.
Ana Laura me diz que tem muita gente com saudades e outros tantos que até hoje jogam sal pelo ombro a menção da minha passagem pela estatal. É sempre assim, em todos os lugares por onde eu passei, desde que me apresentei para trabalhar como estafeta na velha Arno, da avenida do Estado, ainda no final da década de 60.
Reconheço que meu temperamento é difícil e que nem todos tem estrutura para agüentar meu jeito meridional, obstinado e muitas vezes exigente.
Mas, a minha passagem pela Infraero, com o saudoso senador Carlos Wilson à frente da empresa, ainda tem o poder de me deprimir. Não por conta da relação com os profissionais com quem eu trabalhei. Foram os descaminhos de um projeto que tinha tudo para dar certo e que agora coloca o novo governo da presidente Dilma em confronto com uma realidade dura: vai faltar aeroporto no Brasil, nem para a Copa, nem para a Olimpíada, vai faltar mesmo no dia-a-dia. E isso é uma verdade inconteste.
Tive o privilégio de redigir o primeiro paper que o governo do presidente Lula recebeu sobre a situação dos aeroportos em 2003. Se bem me lembro, os fatos eram os seguintes:
  1. O movimento de passageiros era de 75 milhões/ano, o equivalente a um único aeroporto americano, o O’Hare, em Chicago.
  2. A grade de vôos domésticos estava toda viciada com uma superlotação absurda no Santos Dumont, no Rio, na Pampulha, em Belo Horizonte, e, claro, em Congonhas, em São Paulo.
  3. Os aeroportos de Viracopos, em Campinas, Confins e Galeão estavam subaproveitados e praticamente abandonados.
  4. A grade internacional estava toda centrada em Guarulhos. Havia apenas vôos esparsos em outros aeroportos.
  5. Um passageiro havia sido atropelado. Isso mesmo atropelado por um ônibus na pista de Congonhas.
  6. Moradores da Favela da Maré haviam invadido a pista 35, a maior do pais, no aeroporto do Galeão.
  7. A Transbrasil tinha falido deixando um rombo considerável e a carcaça de vários aviões espalhada. A VASP estava às portas da falência e a VARIG depois de 75 anos de bons serviços prestados, estava quebrada, mas mantinha a força de um lobby monumental, controlava o transporte de cargas, os vôos internacionais, etc...
  8. Ninguém sabia direito qual era a função da Infraero. Tudo era muito confuso. Ela se misturava com a Força Aérea, com as companhias de aviação e até com o DAC, Departamento de Aviação Civil do Comando da Aeronáutica.
  9. Os funcionários em sua maioria eram despreparados e 60% deles de alguma maneira tinham um relacionamento familiar com algum parente da Aeronáutica.

Embarque: um Fokker recebe passageiros em 36
Carlos Wilson sabia que os tempos de recessão econômica do governo anterior iam ficar na história e que, na esteira do desenvolvimento, o movimento aéreo iria crescer e crescer muito, como aliás cresceu.
O resgate de Confins e do Galeão infelizmente não colocou Congonhas e Santos Dumont nos padrões que deveriam. O super aeroporto de Viracopos não saiu do papel. E o desastrado aeroporto de Guarulhos, que rigorosamente não tem para onde crescer, virou uma lata de sardinha confusa e apertada.
Claro, nestes últimos anos tivemos o apagão aéreo 1,2 e 3. O acidente da Gol. O acidente da TAM. A quebra da VARIG, o estabelecimento do duopólio Gol-TAM. O surgimento da ANAC. E até alguns malucos que ressuscitaram o projeto do aeroporto de Caieiras, na Grande São Paulo, uma obra faraônica inimaginável, que só poderia ter surgido das entranhas do malufismo nos anos 80. A pobre da Infraero derreteu-se como manteiga ao sol. 
O conturbado cenário da aviação civil brasileira se resolve de uma maneira singela. Basta construir o super aeroporto de Viracopos, tornar operativo o Aeroporto de São José dos Campos. Iniciar a operação do expresso aeroporto entre São José e Campinas, com trens velozes de até 150 quilômetros. Reforma ampla e geral do Aeroporto do Galeão. A construção dos novos aeroportos de Florianópolis, Vitória e Goiânia. Uma malha aérea mais eficiente. Não tem como inventar a roda.
Nestes oito anos o movimento aéreo brasileiro passou de 75 para 150 milhões de passageiros. E nesta década deve dobrar de novo.
Podem jogar quanto sal quiserem pelo ombro, mas não será uma empresa paramilitarizada, que servia para aconchegar parentes de brigadeiros e atender estranhos e convenientes interesses, que vai dar conta deste desafio.
Profissionais como a Ana Laura, a Fernanda Lima, a Claudinha, o André e outros tantos, que se dedicaram a ela durante décadas, deveriam ser mais ouvidos. Eles estiveram no balcão em contato com o público usuário, conhecem todos os meandros da empresa. Não estão nem ai para as efemérides ou para as festinhas.  


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