terça-feira, 19 de outubro de 2010

Alza la bandera revolucionaria.....

Kapa e duas de suas fotos famosas: testemunha voluntária



Ainda outro dia comentava com um amigo querido o célebre episódio de Katyn, na Polônia, quando dezenas de oficiais poloneses foram executados friamente durante a Segunda Guerra. Depois da descoberta dos corpos - e com o apoio da máquina de divulgação stalinista-soviética - a autoria desta atrocidade foi atribuída aos soldados alemães. Mais tarde, descobriu-se que foram mesmo os soviéticos, cumprindo ordens emanadas pelo próprio Kremlin.
Este triste episódio foi magnificamente tratado pelo genial Andrei Wajda no filme Katyn, disponível em locadoras e lojas especializadas. A Polônia, como sabemos, foi uma das maiores vítimas da Segunda Guerra. Apanhou na ida dos alemães e na volta dos soviéticos.
Mas, este meu amigo revelava certa resistência ao filme. Segundo ele, muito desconfortável em relação à causa socialista. Fiquei meio perplexo com a resposta, mas não dei tratos à bola. Não vou perder uma amizade por conta de uma opinião.
Nestes tempos em que vivemos a ameaça de um retorno esdrúxulo de figurinhas carimbadas, me ocorreu que a recidiva do reacionarismo e do conservadorismo se dá sempre muito mais pela incompetência da vanguarda do que por méritos do adversário.
Me veio à mente um importante episódio histórico, prelúdio da Segunda Guerra Mundial: a guerra civil espanhola.
Com a abdicação do rei Afonso XIII, a Espanha experimentou sua proclamação da República. Com as eleições, uma ampla coligação de esquerda saiu-se vitoriosa e chegou ao poder, em fevereiro de 1936. O general Francisco Franco, comandante das tropas espanholas no Marrocos se rebelou e deu início ao confronto. De um lado a força nacionalista da direita, totalmente coesa, congregava centralistas e autoritários. Era apoiada pela Igreja Católica e pelos países fascistas Alemanha e Itália. De outro, os republicanos, um verdadeiro caldeirão de incompatibilidades, onde comunistas e anarquistas buscavam a convivência com regionalistas e libertários. Tinham o apoio declarado da União Soviética e do México e a simpatia de todo o pensamento livre da humanidade, enquanto o exército nacionalista era fortemente equipado, disciplinado e orientado por oficiais alemães e italianos. As forças republicanas eram formadas por milícias de trabalhadores, arregimentados pelos sindicatos e por voluntários espanhóis e de todo o mundo.
Madri: tumulo do fascismo
Foi um banho de sangue! Alguns dos principais jornalistas da época retrataram em reportagens e livros o que ocorreu: Graham Greene, George Orwell e Ernest Hemingway, entre os mais famosos. Mesmo assim, o mundo assistiu impassível ao massacre.
Um dos trabalhos mais notáveis feitos para o cinema sobre o assunto é de autoria do cineasta inglês Ken Louch, de 1997. Chama-se Terra e Liberdade - também disponível em locadoras, livrarias e até na internet para download. É impressionante como o recitativo da esquerda espanhola, quase um apelo desesperado pela manutenção da unidade republicana, ecoa em ouvidos surdos. Dói ver que 75 anos depois, o mesmo eco continua vazio.
- No pasaran! – bradava a Pasionaria, Dolores Ibaburri, em vão.
Pois passaram e continuam passando. E a maioria dos grupos da esquerda ideológica continua a se sentir fascinada pelo som da própria voz e pelo brilho de suas próprias ideias.

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E as novas gerações!


Guernica: célebre obra de Picasso descreve bombardeio em aldeia espanhola





É impressionante como as novas gerações desconhecem e não se interessam por estes episódios históricos tão ilustrativos e diria, reflexivos. Afinal, temos que aprender com os erros, com os fracassos. Celebrar as vitórias e as conquistas é uma ação efêmera. Enevoa a razão e oblitera a verdade.
Katyn revelou que as atrocidades de Stalin rivalizam com as de Hitler. Mas, isso não é suficiente para enterrar a experiência socialista na União Soviética. Um belíssimo trabalho do britânico Antony Beevor, publicado pela Record com o título A Batalha da Espanha, não pode ser incinerado apenas porque ele ousa dizer que se os nacionalistas, a direita, tivessem vencido as eleições a insurgência se daria no lado oposto. O socialista Largo Caballero gritou isso a plenos pulmões na campanha eleitoral. Se aconteceria ou não, é outro problema.
Quando cheguei no MEC fui abordado por dois repórteres da nova geração. Ambos recém formados por instituições de educação de ponta. Eu havia feito uma citação em que relacionava a obra Guernica, de Pablo Picasso, com a guerra civil espanhola. Nenhum dos dois tinha a menor idéia do que eu falava.
A guerra civil espanhola foi uma das páginas mais heróicas da história do século XX. Foi também um cenário onde as contradições do pensamento progressista se expuseram com brutal realismo. Antes, como agora, uma boa reflexão seria útil para olhar o futuro.   

4 comentários:

  1. Confesso que me choquei com tantos esboços, com o tamanho real da obra e a dramaticidade dela. Mas não gostei da realidade do retrato. Que bom seria se pincéis fossem armas de guerra...

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  2. Olá, Nunzio!
    Comecei a ler o seu blog depois do anúncio que você fez pelo gtalk. Os textos são muito interessantes (embora não tenha lido todos ainda). Mas, além do conteúdo, fiquei impressionada por você ser mooquense! Viva a Mooca! rs Um abraço bairrista. rs
    Simone (Harnik)

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  3. Robert Capa, cunhou a frase (sua mais famosa)que define bem o espirito democrata e libertario
    dos jornalistas "engajados":
    "If your picture isn't good enough, you're not close enough."

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  4. Pai, sobre a guerra civil espanhola tem um outro filme belíssimo, um pouco mais difícil de achar, chamado "Libertárias", de Vicente Arandas. O filme trata do grupo "Mujeres Libres", mulheres anarquistas que combateram nas trincheiras e também foram obrigadas a se retirar, mas elas realizavam um trabalho de base com as mulheres na Espanha, como alfabetização, por exemplo, e recrutamento de mulheres em casas de prostituição.

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