segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Um mundo de "tranquilidade" (2a. parte)

Soldados ingleses na trincheira: morticinio do inicio do século
No verão de 1962, o presidente John F. Kennedy ficou profundamente impressionado com a leitura de um livro chamado The Guns of August, de Barbara Tuchman. No ano seguinte, ela ganharia o Prêmio Pullitzer. Mas, antes disso, o célebre ocupante da Casa Branca enfrentou uma crise sem precedentes, que quase acaba com o planeta.
Entusiasmados com um satélite no Caribe, os militares soviéticos iniciaram a implantação de mísseis atômicos em Cuba, com capacidade bélica suficiente para bombardear toda a Costa Leste americana em minutos. De outra parte, os militares americanos viam nesta iniciativa a possibilidade de resgatar a trapalhada do desembarque na Baia dos Porcos, e enfim destronar Fidel Castro.
O desenho era simples. Os militares americanos invadiriam Cuba. Os soviéticos tomariam Berlim. Os dois usariam seus aparatos nucleares e o planeta se transformaria em uma bola atômica a vagar pelo espaço sideral.
Hoje sabe-se que tanto Kennedy quanto o premiere Nikita Sergei Kruchov estavam pressionados pelos militares das duas potências. Não se sabe como o ucraniano enfrentou os gorilas soviéticos. Mas, sabe-se que o americano, ressabiado pela leitura de Canhões em Agosto, enfrentou a disposição bélica dos militares com rigor, acabou com a crise e salvou o mundo de uma guerra nuclear.
O livro, disponível na Biblioteca do Exército (www.bibliex.com.br) , é uma destas obras primas, historicamente preciso, e pormenorizado em detalhes. Fica claro na leitura de suas primeiras páginas que os militares franceses e alemães preparavam-se para a guerra desde 1890. Os alemães amparados na doutrina Clausewitz (guerra rápida) imaginavam invadir a Bélgica e flanquear a França com 400 mil soldados. Outros 300 mil enfrentariam os franceses a partir da Alsácia e formariam uma espécie de pinça, até alcançar Paris. Por sua vez, os franceses imaginavam romper as defesas alemãs na mesma Alsácia, de forma a dividir o exército alemão em dois e chegar a Berlim.       
Mais eficientes, os alemães reforçaram os dormentes da estrada de ferro que chegava a Luxemburgo. Armazenaram alimentação para os cavalos. Fabricaram vagões especiais e reforçaram a indústria metalúrgica para a produção de canhões. Os franceses, mais dispersos, apostaram nas fortificações espalhadas na linha da fronteira.
No dia 1º de agosto de 1914, quando o general Von Moltke, chefe do Estado Maior alemão, já tinha em mãos a ordem de mobilização para a invasão, o Kaiser Guilherme II, militarista convicto e juramentado, sofreu uma crise de consciência e percebeu que a guerra rápida e limpa que ele imaginava não aconteceria. O rei da Bélgica, Alberto I, não aceitara os termos impostos por Berlim e não permitiria a passagem do exército alemão por seu território, para alcançar a Franca. Esta resistência praticamente empurrava a Inglaterra para o conflito. Além disso, ainda que perturbada por levantes operários, a Rússia mantinha clara sua posição de que iria mobilizar seu exército em socorro da França, o que deixava a Alemanha e a Áustria com dois fronts, um a Leste e outro a Oeste.
Ainda que as massas estivessem todas eufóricas nas ruas de Berlim, Guilherme II pediu a Von Moltke, que na melhor das hipóteses desse mais tempo para a diplomacia.
O general alemão, famoso pelo seu monóculo, derrubou uma lágrima, e disse ao imperador que infelizmente não havia como parar a máquina de guerra em movimento há três dias. “Já tomamos Luxemburgo, majestade, o senhor quer que eu devolva?”
Os militares franceses e alemães tanto brincaram de guerra, que agora arrastavam um mundo para um conflito sem precedentes. Curiosamente, naquele quente agosto de 1914, houve euforia nas ruas de Paris, Berlim, Moscou e Londres. Quatro anos depois, o morticínio atingira a casa de 10 milhões de soldados e deixara um estopim para a sua “continuação”, em 1939.
Kennedy não queria ser manipulado pelos militares. Não queria uma aventura militar que poderia representar o fim do mundo. Pagou caro por isso, como se sabe. Quem quiser conferir uma boa versão da crise dos mísseis, pode assistir ao filme Treze dias que abalaram o mundo. Só precisa ter estômago para agüentar o Kevin Costner. Mas, vale a pena.

No próximo post vou contar como a aristocracia européia cedeu lugar as classes médias com o final da Grande Guerra.   

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