quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Mais uma no cravo!

Mario Vargas Llosa: melhor salvar o escritor e esquecer o político
Mario Vargas Llosa acaba de vencer o Prêmio Nobel de Literatura. Traz para a América Latina o sexto prêmio. Antes dele: a chilena Gabriela Mistral, em 1945, o guatemalteco Miguel Angel Astúrias, em 1967, outro chileno, Pablo Neruda, em 1971, o colombiano Gabriel Garcia Marques, em 1982 e o mexicano Octavio Paz, em 1990.
Prêmio Nobel é como Oscar. Nada contra quem ganha. Mas, muito para quem perde. Entre nós latinos é imperdoável que o maior de todos, o argentino Jorge Luis Borges não tenha ganhado. Também fez falta um prêmio a outro argentino, Julio Cortazar.
Isso para não falar dos brasileiros: Manoel Bandeira, Érico Veríssimo, João Cabral de Mello Neto, Guimarães Rosa, entre outros.
É bem verdade que Franz Kafka e James Joyce também não ganharam. E isso serve pelo menos de consolo para a auto-estima nacional.
Llosa merece. Conversa na Catedral, Pantaleão e as Visitadoras, Tia Julia e o Escrevinhador estão entre os livros mais deliciosos que habitaram as mentes lúcidas dos anos 70 e 80. Senhorita de Tacna, que teve tradução para o português por Millor Fernandes, é uma das melhores peças teatrais que eu li e vi.
Em 1990, fui a Lima, no âmago da campanha eleitoral de sucessão do presidente Alan Garcia (o mesmo que está no poder hoje), saber o que pretendia este marco da esquerda latino-americana ao se apresentar como candidato. Não gostei do que vi.
Naquela época o Sendero Luminoso barbarizava. Explodia torres de transmissão e deixava o país em longos períodos no escuro. Llosa fazia uma campanha conservadora e colocava o liberal Alberto Fujimori, cujo governo foi de triste memória, à sua esquerda.
Fui procurá-lo em sua mansão no bairro de Miraflores. Depois de inúmeras tentativas finalmente tive que esperar sua siesta, uma reflexão de duas horas sobre o destino do Peru, até que finalmente ele me recebeu. Não aceitou ser fotografado e deitou uma falação de tal forma reacionária, que me levou a incredulidade. Como poderia o autor de História de Mayta colocar a questão política peruana e latino-americana de forma tão conservadora?
Foi uma entrevista muito triste. Só melhorou quando lhe perguntei sobre A Guerra do Fim do Mundo. Seus olhos se iluminaram e ele parecia outra pessoa falando de Euclydes da Cunha, a quem dedicou o livro, e o levante de Antônio Conselheiro, no Interior da Bahia, no começo do século XX.
Fui para o hotel pensando como seria possível conviver na mesma pessoa uma contradição tão grande. No Jumbão da Varig que vinha do Japão e fazia uma escala em Lima cheguei à conclusão que a visão política de Mario Vargas não tinha nenhuma importância, devia se limitar a mediocridade mesmo. O importante era a forma divina com que ele escrevia. Em outras palavras, se eu quisesse amar o escritor tinha que esquecer o político.
Llosa perdeu para Fujimori. Foi um período terrível para os peruanos. Os polpotinianos do Sendero Luminoso foram perseguidos e encarcerados. Exibidos em jaulas para a opinião pública internacional. Uma vergonha!
Nosso conturbado continente vive um glorioso momento político. Em praticamente todos os países latino-americanos as instituições estão fortalecidas. Nunca fomos tão unidos. Portanto nada mais justo que comemorar o prêmio de Mário Vargas Llosa. Uma vitória para o Peru e para todos nós.
Mais uma no cravo. A ferradura? Que se dane!    

Um comentário:

  1. A academia Sueca perdeu também a oportunidade de dar o premio Nobel a Jorge Amado.
    Pessoalmente aprendi a amar o Brasil lendo seus livros maravilhosos; inteligentes e engraçados.

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